Indígenas do Médio Rio Solimões (AM) cobram participação nas elaborações de políticas públicas
Cinézio Maku Nedëb e Wanem Kanamari entregam documento de denúncias ao presidente interino da Funai. Foto: Cimi Tefé
Indígenas dos povos Kokama, Kambeba, Miranha, Madija Kulina, Deni, Kanamari e Maku Nadeeb, de 27 aldeias da região do Médio Rio Solimões (AM), estiveram em Brasília (DF) na última semana para apresentar reivindicações junto a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi/MEC). Com documentos que apontam descaso do governo federal nas áreas da educação e na consulta prévia em implementação de políticas públicas, as lideranças cobraram urgentes iniciativas contra as sistemáticas violações de direitos sofrida pelos povos da região.
Na sexta-feira (9) a delegação se reuniu com o presidente interino da Funai, Franklinberg Ribeiro de Freitas, onde apontou a ineficiência das políticas públicas aplicada aos povos indígenas por desconsiderarem a Convenção 169 da OIT, que exige consulta prévia na elaboração de projetos que dizem respeito as comunidades tradicionais. “Nossas formas próprias de organização social e política e nossas decisões sobre as políticas públicas, especialmente de educação e saúde, são desrespeitadas ao ponto de sofrermos discriminações sistemáticas por parte dos servidores e dos próprios gestores”, denunciam. No documento entregue ao responsável pela Funai, a delegação exige que lideranças indígenas sejam consultadas mediante espaços institucionais de diálogo e nos processos de formulação de políticas indígenas.
“Não é respeitada a nossa organização social e política. Muitas vezes, há a interferência do poder público municipal em nossos processos de tomara de decisões. Nós temos direito à autodeterminação”, aponta o documento. “Nós temos o direito de definir nossas prioridades, de participar da criação, implementação e fiscalização de planos de desenvolvimento dos governos municipais, estaduais e federal”. A autonomia e o respeito a diversidade étnica estiveram como ponto principal do documento recebido pela instituição.
Foto: Vanessa Araujo
Nomeado presidente interino há um mês, após a exoneração de Antônio Costa, que contrariou o ex-Ministro da Justiça, Osmar Serraglio, por não indicar três coordenadores regionais de confiança do ruralista, Franklinberg Ribeiro de Freitas sustentou o discurso de seu antecessor. “Pouco podemos fazer nesse momento dada a situação de enfraquecimento institucional da Funai. Como vocês sabem, a instituição passa por momentos de redefinição política”, afirmou o militar. Contudo, mesmo diante a cortes de recurso, prometeu aos indígenas o encaminhamento que solicita maior efetivo na unidade de Coordenação Técnicas Local (CTL) de Tefé.
Devido ao insuficiente número de servidores e as longínquas distâncias para chegar as CTLs, alguns povos do Médio Rio Solimões precisam viajar três dias para assistências, como cadastro do Registro Administrativo de Nascimento de Indígena, acessar os serviços da previdência e salário maternidade.
Respostas evasivas na incidência política junto ao MEC
Na quarta-feira (7), em reunião com coordenadora de Educação Escolar Indígena (EEI), Lúcia Alberta de Oliveira, no Ministério da Educação (MEC), a delegação pontou as deficiências das políticas de educação nas cinco regiões que compõem o Médio Rio Solimões. Para as lideranças, a “situação da educação indígena é de extrema precariedade e descaso”. A maioria das solicitações presentes no documento entregue e que foram expostos pelos indígenas durante a reunião dizem respeito ao Plano Político Pedagógico, considerado inadequado. “Não existe o cargo de professores indígenas na rede municipal, por isso falta professores que falem a língua dos povos. Ainda, o material didático está fora da realidade indígena e local”, aponta o documento.
Amavi Minu Deni entrega Documento com as denúncias a Coordenadora Lúcia Oliveira. Foto: Cimi Tefé
Novamente, a autonomia e o direito à consulta para as decisões sobre a escola são negados as comunidades. “A escola deve ser instrumento para a afirmação, fortalecimento e valorização da nossa identidade e cultura, bem como resgatar nossas memórias históricas. A escola indígena deve ter autonomia e ter organização própria, com material didático específico, merenda escolar que respeitem nossas práticas alimentares e professores indígenas, de preferência da própria aldeia”, exige o documento entregue ao MEC. “Para tanto, a participação de comunidades indígenas é imprescindível e nossas deliberações devem ser respeitadas”.
O texto assinala problemas de infraestrutura, como prédios escolares faltando cadeiras e mesas, equipamentos de cozinha e luz. Há atraso no envio das merendas escolares e quando chegam, não respeitam a alimentação tradicional. Na reunião o tuxaua Cinezio Pereira Maku Nedëb apresentou planilhas de investimentos na educação, questionando os fins destes recursos. “Este dinheiro não está sendo utilizado devidamente pelo poder público municipal e queremos saber o que o MEC e a Coordenação de Educação Escolar Indígena têm a dizer sobre essa falta de aplicação dos recursos”, questionou a liderança.
Diante as denúncias e questionamentos apresentados pela delegação, a Coordenação Escolar Indígena enfatizou que não cabe ao MEC fiscalizar o cumprimento das políticas públicas. “Temos a função de ser motivadores, promotores e mediadores, não fiscalizadores. As denúncias devem ser encaminhadas à Secretaria de Educação. Os recursos do FUNDEB são repassados aos municípios”, ressaltou Lúcia Alberta de Oliveira.
A delegação era composta pelos indígenas Jó dos Anjos Samias Kokama, Amavi Minu Deni, Wanem Kanamari, Cinézio Pereira Maku Nedëb e Benaia da Silva Vieira Miranha.
Foto: Cimi Tefé