24/04/2017

Indígenas Kaingang bloqueiam rodovias no RS em protesto ligado às ações do ATL/2017


                                Bloqueio Kaingang na BR-386. Crédito das fotos: Ivan Cesar Cima/Cimi Sul – Equipe Frederico


Indígenas Kaingang bloquearam nesta segunda-feira, 24, a BR-386, na altura do município de Iraí, norte do Rio Grande do Sul. A RS-343 também foi fechada pelos Kaingang, nas proximidade de Vicente Dutra, mais a noroeste do estado. Os protestos reuniram cerca de 700 indígenas nas rodovias durante 8 horas. Outros movimentos foram realizados pelos Kaingang hoje: na Terra Indígena Serrinha, município de Ronda Alta, e Terra Indígena Campo do Meio, município de Gentil.

Foram as primeiras mobilizações indígenas que ocorreram fora de Brasília, durante o início da 14ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL). Um grande número de indígenas Kaingang já estão acampados na Esplanada dos Ministérios. O objetivo é sincronizar as ações para enfrentar de forma contundente "uma conjuntura de morte muito e pior do que estava nos últimos anos", nas palavras de Kretã Kaingang, que está na Capital Federal acompanhando a delegação da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ArpinSul).

Os grupos protestaram pela demarcação das terras indígenas no Rio Grande do Sul, mas sobretudo contra o desmonte em curso da Fundação Nacional do Índio (Funai) e exigindo o fim da pressão de deputados estaduais e federais ruralistas para a nomeação de ao menos 50 indicados ao órgão indigenista do Estado. Os Kaingang demonstraram em cartazes contrariedade às reformas da previdência e trabalhista.

"Além da falta de demarcação, que deixa a gente numa covardia nas mãos de quem nos quer fora das terras sagradas, os ruralistas tão querendo tomar a Funai de vez. O pouco que a gente tem ainda está lá, e querem nos tirar. Temos de protestar contra isso, resistir. Viemos aqui dar o nosso recado", conforme as lideranças afirmaram, inclusive enviando documentos a serem protocolados em Brasília durante o ATL.  

Morador da Terra Indígena Rio dos Índios, o cacique Luiz Salvador afirmou que se trata de uma luta que ocorre desde a invasão dos territórios indígenas. "Estamos sendo engolidos por um governo, por um capitalismo que não enxerga como a situação está hoje. Estão precarizando a Funai. O Alceu Moreira (deputado ruralista do PMDB/RS) está indicando gente pra Funai", diz.

Salvador pede a facilitação do governo à Funai no intuito de criar Grupos de Trabalhos para a demarcação de terras, além da conclusão de procedimentos ainda em aberto. "Quem sofre mais com isso são as crianças, os idosos. O governo precisa se normalizar, o jeito que está é realmente fora". A previsão, de acordo com o cacique, é de mais ações durante os próximos três dias.

Para os Kaingang é inaceitável a interferência de políticos ruralistas que "ontem queriam o fim da Funai, fizeram CPI e tudo e agora querem indicar gente de confiança para ocupar cargos", diz o cacique. Além de Moreira, o deputado federal ruralista Luiz Carlos Heinze (PP/RS) indicou Ubiratan de Souza Maia para ocupar um cargo de relevo na Funai, em Brasília. Ubiratan, como amostra do perfil indicado, foi condenado pela Justiça Federal pelo arrendamento ilegal da Terra Indígena Xapecó, em SC.

Michel Temer e os ministros da Justiça, Osmar Serraglio, e Planejamento, Dyogo de Oliveira, publicaram no dia 24 de março o Decreto 9010/17 que extinguiu 87 cargos comissionados; outros 51 cargos de Coordenação Técnica Local (CTL) deixaram de existir, bem como três Frentes de Proteção Etnoambiental dos Povos Isolados. Este ano, os recursos da Funai tiveram um corte de 38% com relação a 2016.

O discurso de contenção de despesas, portanto, não convence os povos indígenas. Quase um mês depois do decreto, em 19 de abril, Dia do Índio, o presidente da Funai, Antônio Costa, acabou demitido por se negar a nomear 50 indicados pelos parlamentares ruralistas André Moura (PSC-SE), líder do governo na Câmara Federal, e Carlos Marun (PMDB/MS).

A Reforma da Previdência foi outro assunto abordado pelos protestos de hoje: "Sobrevivemos da terra, sem uma relação de mercadoria. A Constituição entende isso, mas esse governo que não foi eleito pelo povo, mas sim por uma meia dúzia de oportunistas, pretende desrespeitar tudo e beneficiar uns poucos. Estamos com os trabalhadores e toda a sociedade do país contra estas reformas", diz Salvador.



Reforma da Previdência    

A Reforma da Previdência é uma outra preocupação não apenas dos Kaingang. A proposta modifica a seguridade especial, destinada a trabalhadores rurais, indígenas, ribeirinhos e demais comunidades tradicionais. Pela atual regra, este segurado pode se aposentar por idade cinco anos antes dos demais. Isso irá acabar, e o segurado especial passa a se aposentar com a mesma idade dos demais.


"A proposta é igualar a idade mínima dos trabalhadores urbanos e rurais, bem como instituir uma cobrança individual mínima e periódica para o segurado especial, substituindo o modelo de recolhimento previdenciário sobre o resultado da comercialização da produção", diz trecho de parecer do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Leia o documento na íntegra aqui.

Fonte: Mobilização Nacional Indígena
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