23/11/2016

Justiça determina o despejo de indígenas Terena de fazenda que sobrepõe 35% da TI Taunay/Ipegue


Plantações de comunidade Terena na área alvo do despejo. Fotos: Luiz Henrique Eloy Terena


Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

A Justiça Federal de Campo Grande (MS) determinou o despejo de 78 famílias Terena da Fazenda Esperança de propriedade da família da deputada federal ruralista Tereza Cristina (PSB/MS). A Fazenda possui 12 mil hectares sobrepostos à Terra Indígena Taunay/Ipegue, declarada em maio deste ano pelo Ministério da Justiça como de posse tradicional dos Terena. A área da Fazenda Esperança equivale a 35% do território autorizado pela Portaria Declaratória 497 a ser demarcado de maneira física, no município de Aquidauana, com marcos delimitando 33.900 hectares.

O despacho da Justiça é do último dia 16, com prazo estipulado de execução para dez dias, e foi publicada por pressão de determinação do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região de maio deste ano. Caso não seja realizada em dez dias, a Justiça Federal autorizou o uso de força policial para o despejo – fora multa de R$ 5 mil por dia revertida para os proprietários.

"Registro que ao proferir a r. decisão de fl. 719, objeto da Reclamação, este Juízo ponderou as peculiaridades do caso em apreço, especialmente o tempo decorrido desde o esbulho noticiado nos autos e desde a decisão reintegratória", conforme trecho da decisão de reintegração. A Justiça Federal havia decidido ouvir a comunidade, mas os proprietários reclamaram ao TRF-3 que o juiz se negava a cumprir a decisão. Um despacho obrigou o magistrado a cumprir a decisão dos desembargadores.  

Lideranças do Conselho Terena afirmam que as famílias não irão sair da terra – usada para a produção de alimentos, criação de animais e reflorestamento. "O governo federal precisa concluir a demarcação. Pode mandar a polícia, a gente não sai. Do nosso direito à terra não abrimos mão", diz uma liderança Terena. Em 30 de maio de 2013, a Fazenda Esperança foi retomada pelos Terena. A ação ocorreu um dia depois do assassinato de Oziel Terena, durante reintegração de posse na Terra Indígena Buriti, em Sidrolândia.

Quando os Terena ocuparam a Fazenda, a propriedade se encontrava vazia. Dos pouco mais de 5 mil indígenas, confinados em 6 mil hectares do que tinham da Taunay/Ipegue, e com severas dificuldades de garantir a alimentação das aldeias, 78 famílias se estabeleceram em uma porção do território tradicional recuperado. Já outra parte foi destinada ao plantio e criações para o sustento; uma terceira porção foi totalmente reflorestada.  




Taunay/Ipegue: um longo caminho

Os donos, porém, logo apareceram: Mirian Alves Correa e Monica Alves Correa, parentes da ruralista Tereza Cristina. "Ainda em 2013 a Justiça Federal concedeu liminar e mandou reintegrar. No entanto, a comunidade recorreu e o presidente do TRF-3 suspendeu a liminar. Então as fazendeiras recorreram", explica o advogado Luiz Henrique Eloy, indígena Terena de Taunay/Ipegue.

Novamente no mês de maio, só que deste ano, o Órgão Especial do TRF-3, uma turma destacada de desembargadores, acatou o recurso e mandou reintegrar novamente.

"Essa decisão então chegou ao juiz de primeira instância. Só que ele entendeu que três anos se passaram das famílias no local e achou por bem ouvir a comunidade antes de qualquer decisão. As fazendeiras entraram com uma reclamação no TRF-3 dizendo que o juiz estava descumprindo a decisão e o TRF-3 despachou mandando o juiz cumprir a determinação dos desembargadores", lamenta o advogado Terena.  

Sem ouvir a comunidade, a Justiça Federal de Campo Grande mandou reintegrar. "A existência de processo administrativo de demarcação e ampliação da Terra Indígena Taunay-Ipegue ainda em curso, não permite que o Poder Judiciário, antecipando-se a uma função própria do Poder Executivo, negue à parte autora seu legítimo direito de propriedade. (SIC)", diz o juiz em trecho da sentença.

Taunay/Ipegue foi inicialmente reservada pelo extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI), antes da década de 1970. Como toda reserva no Mato Grosso do Sul, os Terena ficaram confinados e viram os territórios tradicionais de onde foram retirados sendo ocupados por fazendas. Em 1984 a reserva passou a ser revista, com o processo se encerrando em 1991. No entanto, realizado sob vícios pré-Constituição de 1988.


Em 1999, os sucessivos erros passaram a ser reparados com uma nova revisão. Esse processo, que já dura 17 anos e teve como última movimentação a Portaria Declaratória, traz seguidas ameaças aos Terena. "Só nós sabemos o que passamos aqui. Dormimos num lamaçal todas as noites (…) O sonho dos nossos pais e avós era voltar pra essa terra, e seguimos adiante com esse sonho", disse uma liderança Terena em julho de 2013, depois de ataques de pistoleiros na retomada da Fazenda Esperança – assista aqui.

Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi
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