TJ/MA suspende segunda decisão da Justiça Estadual contra o povo Gamela
Foto: Cimi Regional Maranhão
Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi
O desembargador Marcelo Carvalho Silva do Tribunal de Justiça do Maranhão suspendeu, no final da semana passada, um interdito proibitório contra o povo Gamela determinado pela Justiça Estadual da Vara de Matinha. “Reconhecendo a incompetência absoluta da Justiça Comum para processar e julgar o feito”, o desembargador decidiu pela “imediata remessa” da ação original à Justiça Federal.
Esta é a segunda suspensão decidida pelos desembargadores do TJ-MA envolvendo sentenças contra o povo Gamela do juiz Celso Serafim Júnior, da Comarca Estadual de Matinha. No último dia 04, o TJ suspendeu a reintegração de posse da aldeia Piraí, localizada entre os municípios de Viana e Matinha. O Interdito proibitório, concedido a favor da família Cutrim, seria para impedir suposta agressão por parte dos Gamela à posse privada de terras tradicionais reivindicada pelo povo.
A ação foi parar no Tribunal de Justiça do Maranhão por força de um agravo de instrumento dos Gamela, impetrado pelo advogado Antonio Rafael Silva Júnior, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), com o apoio da assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). “O juiz estadual tinha dado duas decisões possessórias (que protegem o direito de propriedade). Uma era a reintegração e a outra o interdito. As duas caíram. O desembargador ainda decide que são ações que cabem à Justiça Federal, o que vínhamos defendendo”, explica o advogado.
Caso os Gamela retomassem áreas dentro da suposta propriedade da família Cutrim, o juiz estadual determinou uma multa de R$ 100 mil a ser paga “por alguma associação civil a qual eles estejam vinculados". O desembargador citou os incisos I e XI do artigo 109 da Constituição Federal para argumentar que compete à Justiça Federal processar e julgar as causas em que a União está presente, o que, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), envolve controvérsias relacionadas aos direitos indígenas. Citou ainda jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF).
Plano para assassinatos
Os Gamela divulgaram na semana passada uma nota pública (leia aqui) denunciando os planos de fazendeiros para matar lideranças do povo. Os indígenas gravaram as ameaças realizadas pelo fazendeiro José Manoel Penha, incluindo o relato dos planos de assassinatos. Conhecido como Castelo, Penha revelou uma reunião realizada entre fazendeiros, na cidade de Viana, para tratar das “invasões” realizadas pelos Gamela. Segundo Penha, na nota divulgada pelos indígenas, a solução seria matar “uns quatro cabeças”. Outros planos dão conta do assassinato de um padre da Igreja Católica, que apoia os Gamela.
“Em 15 de fevereiro, estas ameaças foram apresentadas ao Secretário Estadual de Segurança Pública e ao Superintendente de Polícia Civil do Interior, bem como foram entregues as gravações. Também foram registradas na Superintendência da Policia Federal, no Maranhão (SIC)”, diz trecho da nota dos Gamela. Nenhuma investigação foi realizada pelas autoridades públicas competentes. “No dia 21 de agosto, pistoleiros (…) invadiram a nossa aldeia, dispararam tiros de uma pistola .40 e ainda prometeram um banho de sangue”, segue a nota. A aldeia em questão é a Piraí, alvo da reintegração de posse indeferida pelo TJ/MA e com a incidência da propriedade de Tenack Serra Costa Júnior, também conhecido como Júnior da Cerâmica.
As lideranças ameaçadas e citadas pelos fazendeiros são Antonio de Marcírio, Jaleco, Inaldo, Jaldo, Kaw, Mandioca, Foboca, Zé Oscar, ‘Seu’ Duca e Carrinho. Na invasão de pistoleiros em 21 de agosto, três homens armados e trajando coletes à prova de bala invadiram a retomada realizada pelo povo Gamela. Conforme os indígenas, os homens chegaram numa caminhonete branca, se identificaram como policiais e chamaram pelas lideranças do povo. Procurando pelas lideranças, os indivíduos ameaçaram os indígenas e estavam em uma caminhonete cuja placa está registrada no nome da Ostensiva Segurança Privada LTDA., com sede em São José do Ribamar (MA) – conforme apuração na Secretaria Estadual de Segurança Pública.