07/07/2016

Pesquisadores da SBPC denunciam violações aos direitos indígenas



Pesquisadores presentes no 3º encontro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) Indígena, em Porto Seguro, na Bahia, por ocasião da 68ª reunião anual e geral da SBPC, aprovaram uma moção de repúdio às violações dos direitos indígenas. Na carta denunciam o descaso estatal com a garantia constitucional do território tradicional aos povos indígenas e a violência sofrida pelas aldeias.


É inadmissível, no âmbito do Estado democrático de direito que sejam violados os direitos originários garantidos tanto na constituição brasileira quanto nos instrumentos jurídicos internacionais dos quais o Brasil é signatário”, diz trecho da moção. No documento, os pesquisadores indígenas criticam ainda o desmonte da Fundação nacional do Índio (Funai) e de secretarias e controle social no âmbito do Ministério da Educação pelo governo provisório do presidente interino Michel Temer.


Leia a moção na íntegra:


Moção de repúdio às violações dos direitos indígenas


Nós, pesquisadores indígenas, reunidos com nossos caciques, lideranças e aliados da causa indígena, por ocasião da 3ª SBPC Indígena no âmbito da 68ª Reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, nos dias 03 a 08 de julho de 2016, em Porto Seguro – BA, vimos a público denunciar, e repudiar, os retrocessos aos direitos dos povos indígenas e expressar a defesa incondicional desses direitos.


É inadmissível, no âmbito do Estado democrático de direito que sejam violados os direitos originários garantidos tanto na constituição brasileira quanto nos instrumentos jurídicos internacionais dos quais o Brasil é signatário.


Diante do exposto, repudiamos:


  • O sistemático desaparelhamento do órgão indigenista – Fundação Nacional do Índio (FUNAI) que ora culmina com a indicação do general Roberto Sebastião Peternelli Junior à presidência do órgão, considerada uma afronta à autodeterminação dos povos indígenas;


  • O Projeto de Emenda Constitucional 215 e o Projeto de Lei 1610, por atentarem frontalmente contra os direitos dos povos indígenas;


  • O uso da violência policial e os recorrentes assassinatos, que permanecem impunes, de líderes indígenas;


  • A criminalização de lideranças indígenas com o uso de prisões temporárias que se estendem por meses, sem audiência de tutela;


  • A sistemática negação dos direitos sociais – a educação diferenciada acesso e permanência no ensino superior em todos os níveis, saúde, saneamento básico e água potável – especialmente às comunidades indígenas que se encontram em áreas de conflito e vulnerabilidade, como os Guarani-Kaiowá;


  • O descaso e a omissão das autoridades, diante da tragédia socioambiental do Rio Doce, provocada pelas empresas mineradoras – Samarco e Vale – atingindo diretamente a sobrevivência dos povos indígenas Krenak, Tupiniquim e Guarani;


  • O não cumprimento da Constituição Federal no que concerne à proteção dos povos indígenas e à demarcação dos seus territórios tradicionais, principalmente nos casos dos Guarani-kaiowá; Pataxó das T.I. de Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatiba; e T.I. Tupinambá de Olivença;

  • Qualquer tipo de retrocesso aos direitos garantidos constitucionalmente na Educação Escolar Indígena diferenciada, específica, intercultural, bilíngue e comunitária. Expressamos, portanto, pleno apoio aos professores indígenas, defendemos a manutenção de todos os programas voltados à educação escolar indígena, exigindo que o Estado brasileiro, por meio do Ministério da Educação, Secretarias estaduais e municipais de educação, assuma os Territórios Etnoeducacionais e realize a II Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena;

  • Qualquer tentativa de retrocesso com a implementação da Base Nacional Curricular Comum, em relação às orientações curriculares e às Diretrizes Nacionais da Educação Escolar Indígena Específica e Intercultural, já garantidas em marco regulatório. O governo deverá garantir as especificidades culturais, identitárias e do Bem Viver dos povos indígenas do Brasil;

  • A implantação de projetos ou medidas que interfiram nos hábitos, costumes e organização sóciopolítica dos nossos povos sem a consulta prévia, conforme estabelece a Constituição Federal, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Declaração da Organização dos Estados Americanos sobre os Povos Indígenas;

  • A utilização dos meios de comunicação, concessões públicas, para a pregação do ódio, da divisão, do racismo e da discriminação, principalmente contra os povos indígenas. O respeito à diversidade étnica e cultural deve ser balizador das atividades destes meios e qualquer infração deverá ser punida pelo poder público. Não podemos confundir a liberdade de expressão e de opinião com o direito de atacar a integridade e a honra de cidadãos ou de povos indígenas, a exemplo do que aconteceu recentemente com o povo Maxacali, para o que exigimos reparação;

  • Todas as formas de genocídio e violação de direitos, atentados contra a vida, crimes hediondos conforme o Artigo nº 07 da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos povos indígenas, em que se afirma que “os povos indígenas têm o direito coletivo de viver em liberdade, paz e segurança, como povos distintos, e não serão submetidos a qualquer ato de genocídio ou a qualquer outro ato de violência“.

Considerando que tivemos visíveis avanços no campo dos direitos formais nas últimas décadas, nossos povos e lideranças não permitirão que grupos conservadores da sociedade brasileira retirem e anulem tais direitos, conquistados à custa de muita luta nossa e dos nossos antepassados. Os avanços conquistados pelos nossos povos são, também, o avanço da sociedade nacional à qual pertencemos.


Nossos direitos são a busca da superação de uma subalternidade cultural e econômica imposta pelo sistema colonizador sobre nossos povos e por extensão a toda a população brasileira. Não há recuo possível! Não há golpe que consiga impor ao povo brasileiro o retrocesso à sua dignidade e, aos povos indígenas, a redução dos seus direitos.

Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi
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