I Assembleia da Juventude Indígena do Nordeste define agenda de lutas pelo direito à terra
A expectativa era de um encontro na aldeia Pedra D’água, Terra Indígena Xukuru do Ororubá, município de Pesqueira (PE), mas as duas centenas de jovens indígenas do Nordeste perceberam que na verdade se tratava de uma Assembleia. Entre os dias 21 e 23 de maio, os autointulados Filhos da Constituinte, tema do encontro, se debruçaram sobre os problemas da conjuntura do país em interface com a luta de seus povos.
O que os jovens indígenas fizeram, na verdade, uma analisar os flagrantes desrespeitos à Constituição de 1988, e não apenas no que tange os direitos dos povos. Decidiram não reconhecer o “governo do presidente interino Michel Temer como legítimo”, e foram além: “Sentimos a necessidade de fortalecer os jovens no conhecimento de seus direitos e deveres junto aos seus povos. Procuramos articular a juventude de diversos povos do Nordeste para que estes conheçam e reconheçam a importância do processo constituinte”, diz trecho da carta da I Assembleia da Juventude Indígena do Nordeste.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 também foi alvo de críticas dos jovens e a devida participação deles nas lutas de resistência a propostas do gênero. O Marco Temporal, que foi incorporado à PEC 215, passou a ser entendido pela juventude como uma nova forma de atacar o direito à terra. Essa tese defende que território indígena só pode ser demarcado caso o povo que o revindique comprove ocupação ou litígio a partir da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988.
Leia a carta da I Assembleia na íntegra:
Carta da I Assembleia da Juventude do Nordeste
Nós jovens e lideranças indígenas do Nordeste estivemos reunidos em assembleia, na Aldeia Pedra D’água Terra Indígena Xukuru do Ororubá entre os dias 21 e 23 de Maio de 2016, em homenagem ao grande Guerreiro da Paz Xikão Xukuru, com o tema: FILHOS DA CONSTITUINTE, se fizeram presentes nesse momento os povos indígenas dos estados da Bahia (Pataxó, Pataxó hã hã hãe, Tumbalala, Tuxá, Tupitambá), Alagoas (Xukuru Kariri, Katokinn, Koiupanká, Kalankó), Paraíba (Potiguara, Tabajara), Ceará (Kanidé, Pitaguary, Anacé, Tapeba), Rio Grande do Norte (Potiguara do Amarelão) e Pernambuco (Atikun, Entre Serras Pankararú, Kambiwá, Kampinawá, Pankará de Itacuruba, Pankararú, Pipipã, Truká, Tuxá e Xukuru), juntamente com os nossos parceiros e aliados da causa indígena.
Partindo da preocupação mediante a conjuntura política pela a qual o nosso país passa, e não reconhecendo o governo do presidente interino Michel Temer como legítimo, sentimos a necessidade de fortalecer os jovens no conhecimento de seus direitos e deveres junto aos seus povos. Procuramos articular a juventude de diversos povos do Nordeste para que estes conheçam e reconheçam a importância do processo constituinte e como esse momento se assemelha ao qual passamos hoje, momento este de reafirmamos os nossos direitos garantidos na constituição de 1988, que naquele marco histórico contou com a participação de várias das nossas lideranças.
Os povos presentes por meio de um túnel do tempo reviveram a memória dos processos de luta pelos os quais passaram desde o princípio da colonização até o presente momento. Podemos então perceber a força e resistência dos nossos povos, na luta pela a posse e permanência nos nossos territórios sagrados que são as moradias dos nossos encantados.
Todas os povos presentes reafirmaram o desejo pelo avanço dos processos demarcatórios de todas as terras indígenas que ainda não tiveram esse processo concluído ou se quer iniciado, conforme rege os artigos 231 e 232 da constituição de 88, assim como a garantia do direito aos territórios já demarcados, colocando-se contra a PEC 215 que propõe um retrocesso nos direitos garantidos na constituição de 1988 e assim sendo exigimos o seu imediato arquivamento bem como a não utilização do subterfúgio do Marco Temporal pelo poder judiciário.
A partir da conquista dos nossos territórios precisamos garantir a manutenção dos mesmos, zelando e preservando-os, com este intuito nós povos indígenas do Nordeste apresentamos como demanda o direito a uma educação especifica e diferenciada dentro das nossas comunidades, com escolas indígenas de estruturas físicas de qualidade e acesso facilitado tendo como objetivo fortalecer o projeto de futuro das nossas etnias. Buscamos também uma saúde especifica, que valorize os conhecimentos dos nossos anciões e a utilização das medicinas tradicionais e espirituais, proporcionando a manutenção dos costumes e tradições de cada povo e preservando as nossas plantas através da pratica do reflorestamento, para assim garantir a morada dos nossos encantados. Reivindicam ainda a permanência e ampliação dos cursos universitários para os povos indígenas do Brasil e que as universidades utilizem-se de artifícios para conter as inúmeras formas de preconceitos sofridas pelos os estudantes indígenas.
O fortalecimento da organização da juventude foi apontando como uma das principais necessidades do movimento de luta indígena no Nordeste, para garantir a posse e permanência nos nossos territórios, partindo dessa realidade os jovens representantes dos povos presentes nessa assembleia criam um grupo que tem como finalidade articular a base para a criação de uma comissão de juventude a nível regional.
Assim afirmamos é golpe, mas não é NOCALTE. E diga ao povo que avance.
AVANÇAREMOS!
Aldeia Pedra D’água, Terra Indígena Xukuru do Ororuba, Pesqueira – PE, 23 de Maio de 2016.
Fotos: Zennus Dynis/Cimi-NE