A questão indígena como tema de discussão e debate no curso para a Magistratura Federal da 4ª Região
Na manhã do dia 26 de novembro de 2015, Roberto Antonio Liebgott (Cimi) e Iara Tatiana Bonin (PPGEDU/ULBRA) participaram de uma rodada de palestras sobre direitos indígenas, terra e territorialidade, em uma atividade de capacitação promovida, de forma conjunta, pela Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Emagis/TRF4) e o Memorial da Justiça Federal do RS (JFRS). O objetivo desta atividade formativa, destinada especialmente a magistrados dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, é promover uma aproximação entre o Direito e outras áreas de conhecimento, para que sejam considerados os aspectos culturais, antropológicos e socais nos processos Judiciais.
As atividades foram iniciadas com a exibição do filme Desterro Guarani, uma realização de Ariel Ortega, Patrícia Ferreira, Ernesto Ignácio de Carvalho e Vincent Carelli, no âmbito do projeto Vídeo nas Aldeias, que apresenta, sob a perspectiva dos Mbyá Guarani, os processos históricos de espoliação territorial. A rodada de palestras foi presidida pela Juíza Federal Ingrid Schroder Sliwka. Cada um dos expositores teve quarenta minutos para abordar a temática indígena a partir do filme.
Ernesto Ignácio de Carvalho, um dos produtores do filme, explicou como as imagens foram produzidas e editadas, ressaltando a importância de se fazer um trabalho, no campo da produção audiovisual, cujos protagonistas sejam os próprios indígenas, para que as histórias possam ser narradas desde suas perspectivas.
Roberto Liebgott fez uma abordagem histórica sobre as lutas, desafios e formas de resistência dos Povos Indígenas no Brasil, com ênfase para o processo de colonização desencadeado no Grande do Sul no início e meados do século vinte e suas consequências na contemporaneidade. Depois pontuou, no âmbito dos direitos constitucionais dos Povos Indígenas, as três grandes conquistas: o direito as diferenças; o fim da tutela – portanto da subserviência dos povos ao Estado – tornando-se sujeitos de direitos individuais e coletivos; e a garantia constitucional do direito originário sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Por fim, Roberto trouxe para o debate a decisão do julgamento, pelo STF, do processo contra a homologação da demarcação da Terra Raposa Serra do Sol e os seus desdobramentos no âmbito dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, com ênfase para o “marco temporal da Constituição de 1988”, constituindo-se como mais um marco limitador do direito a demarcação de uma terra indígena; e a PEC 215/2000 que, em essência, pretende inviabilizar as garantias constitucionais dos povos indígenas, transferido para o Congresso Nacional a responsabilidade pelas demarcações de terras.
Iara Bonin iniciou destacando que é necessário problematizar as imagens que circulam sobre os povos indígenas – em meios de comunicação, filmes, materiais didáticos, por exemplo – e que os posicionam como povos obsoletos e anacrônicos, ou apenas dão relevo a aspectos exóticos de suas culturas. Ela ressaltou a necessidade de serem consideradas as distintas cosmovisões indígenas e suas formas particulares de pensamento e de expressão, quando se pretende fazer a escuta de suas histórias, de seus depoimentos, de suas versões sobre os acontecimentos nos processos Judiciais. Também foram destacados diferentes significados e formas de proceder à ocupação tradicional da terra, por parte dos povos indígenas no sul do país, especialmente porque muitos foram (e, muitas ainda estão) impedidos, de efetivamente habitar suas terras, uma vez que sobre elas incidem títulos privados.
Depois das exposições ocorreu um debate centrado em três grandes questões: densidade demográfica das populações indígenas e falta de terra; conflitos com os pequenos agricultores; e impossibilidade de indenização dos títulos de propriedade aos afetados pelas demarcações.
Porto Alegre, RS, 26 de novembro de 2015.
Cimi Regional Sul – Equipe Porto Alegre