13/04/2015

Assembleia em Rondônia busca fortalecer a luta em defesa dos direitos indígenas

Em função da Assembleia do Movimento Indígena de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas, que aconteceu entre os dias 7 e 10 de abril, em Rondônia, as lideranças indígenas presentes elaboraram um documento apresentando as principais preocupações diante da realidade vivenciada pelas comunidades e territórios tradicionais. O tema do encontro foi "Fortalecer, Proteger e Unificar as lutas em Defesa dos Direitos Indígenas", e embasou o documento que ainda apresenta uma série de reivindicações relacionadas à saúde, educação e terra. Confira a Carta na íntegra:

OPIROMA

Organização dos Povos Indígenas de Rondônia, noroeste do Mato Grosso e sul do Amazonas.

CARTA FINAL DOS PARTICIPANTES DO ABRIL INDÍGENA 2015

            NÓS, lideranças indígenas presentes na grande Assembléia do Movimento Indígena de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas, de 07 a 10 de abril de 2015, no Abril Indígena Regional, no Centro Arquidiocesano de Pastoral – CAP, Km 12, setor chacareiro, Porto Velho – Rondônia, membros dos Povos: Apurinã, Aikanã, Arara, Cinta Larga, Cujubim, Gavião, Guarasugwe, Jiahui, Karitiana/Juari, Kassupá, Kaxarari/Hunicuni, Kwazá, Lakondê, Migueleno, Mamaindê, Massacá, Macurap, Munduruku, Oro Waram Xijein, Oro Waram, Oro Mon, Oro Nao’, Puruborá, Parintintin, Suruí/Paíter, Sakirabiar, Sabanê, Tupari, Terena, Tenharim, Oro Win e Wayoró, com o Tema: “Fortalecer, Proteger e Unificar as lutas em Defesa dos Direitos Indígenas”, discutindo, avaliando e refletindo sobre os problemas que nos atingem, expomos nossas angustias, preocupações e violências ainda vivenciadas diariamente por nossas comunidades e territórios tradicionais, no que se referem:

SAÚDE

01 – Constatamos mais uma vez que a falta de um atendimento diferenciado tem provocado a morte de muitas crianças, gestantes e idosos, que são os mais vulneráveis e vítimas deste atendimento.

02 – Pacientes que necessitam de tratamento especializado, dentro e fora do Estado estão morrendo à míngua, porque não é priorizado seu encaminhamento.

03 – Exigimos a formação continuada e capacitação dos AIS, AISAN e valorização dos pajés, herboristas e parteiras indígenas;

04 – As estruturas das Casas de Saúde Indígena e das equipes são precárias. Faltam equipe médica, medicamentos, equipamentos e formação especifica dos profissionais envolvidos.

05 – Ter medicamentos básicos nos postos de saúde das aldeias, algumas aldeias ficam muito distantes e são de difícil acesso. Por isso, não é possível, pelo menos nesses casos, exigir receita medica para o fornecimento de medicamentos para uma simples dor de cabeça ou diarreia. Alem disso, muitos pacientes são obrigados a comprar os medicamentos receitados.

06 – Os Distritos Sanitários Especial Indígena terceirizaram os serviços de transporte, não atendendo indígenas fora do horário de trabalho.

07 – O apadrinhamento político na SESAI desestruturou o atendimento às populações e favoreceu a corrupção.

08 – Garantir a participação da OPIROMA e dos representantes indígenas nos Conselhos Municipais e no Conselho Estadual para garantir a pactuação da saúde indígena nos municípios e estados;

09 – Buscar parcerias institucionais para fortalecer a segurança alimentar e nutricional das comunidades;

10 – Exigir respeito às decisões do controle social cumprindo o plano distrital elaborado pelas comunidades e aprovados pelos Conselhos;

11- Intensificar a fiscalização por parte do Ministério Publico Federal e Tribunal de Contas para evitar mau uso dos recursos destinados à saúde indígena;

12 – Exigimos o atendimento aos indígenas que moram na cidade.

13 – Repudiamos a decisão da criação do INSI por não atender as especificidades da saúde indígena por sucatear e fragilizar o atendimento as populações beneficiárias e denunciamos as atitudes desrespeitosas de funcionários da SESAI por pressionar, intimidar e coagir lideranças e conselheiros em favor do INSI;

14 – Denunciamos os 240 casos de hepatite na região de Guajará Mirim e centenas de casos de tuberculose em toda a região sem que haja assistência médica levando muitos parentes a óbito pela falta de tratamento.

15- Necessidade de equipe multidisciplinar para atuação nas aldeias, dentre eles antropólogo e psicólogo.

16. Garantir a participação, com direito a voz e a voto, do movimento indígena, dentro do Conselho de Saúde Distrital.

EDUCAÇÃO:

01 – Exigimos a imediata implementação da Lei 578/10 que criou o cargo de magistério público indígena e quadro administrativo, notadamente no que se refere ao concurso público para esses cargos e às nomeações previstas nos artigos 41 e 42 desta Lei.

02 – Criação e instalação do Conselho de Educação Escolar Indígena de Rondônia, de forma deliberativo, com participação indígena desde à concepção desse Conselho e garantir a participação da OPIROMA indígena;

03 –  Criação de uma Gerência de Educação Escolar Indígena para garantir de fato e de direito uma educação escolar específica e diferenciada, segundo os princípios aprovados pelo MEC, com gerencias nas CREAs para fortalecer a garantia dos direitos com efetiva participação das lideranças;

04 – Implantação do Projeto do Sexto ao Nono ano, do EJA (Educação de Jovens e Adultos) e Ensino Médio em todas as Escolas Indígenas com cursos profissional adaptados à nossa realidade. Denunciamos que a implantação do Ensino médio a distancia em Guajará Mirim, não atende a demanda das especificidades e ensino de qualidade;

05 – Agilidade na construção de escolas indígenas adaptadas à realidade local, com estrutura física que garanta seu bom funcionamento, em RO, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas, porque tem muita promessa e pouca realização;

06 – Garantir o atendimento de acordo com o Projeto Político Pedagógico das escolas indígenas construído em conjunto com as comunidades;

07 – Avaliar o Projeto Açaí e a necessidade de reduzir a abrangência, exigindo implantação de cursos profissionalizantes em nível do ensino médio nas diversas áreas dos saberes;

08 – Garantir o ensino bilíngue que é um direito sem supervalorizar a língua portuguesa, preparando bem os estudantes para enfrentar a relação aldeia – cidade – aldeia, aliando a tecnologia no processo de aprendizado como instrumento de defesa dos direitos;

08 – Que a UNIR assegure o cumprimento da Lei 12.711/12 referente ao ingresso de estudantes indígenas na educação superior pública de Rondônia e não só no Intercultural que tem sérios problemas em sua execução; atender por região e não juntar tudo; executar sem comprometer o atendimento aos alunos;

09 – Garantir a Alimentação Escolar para todas as escolas indígenas, adquirindo produtos das próprias comunidades via PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, gerenciado pela gerencia indígena nas CREAs;

10 – Trabalhar junto à OPIRON para fortalecer a luta pelos direitos à educação escolar indígena e na produção de conhecimentos indígenas;

11- Efetivação de todos os  territórios etnoeducacionais da  região de abrangência do movimento indígena;

TERRA:

01 – Nós povos presentes nesta Assembléia auto-reconhecemos e exigimos do Governo Brasileiro o levantamento e reconhecimento étnico e territorial dos povos Chiquitano (Costa Marques/RO), Cassupá (Costa Marques/RO), Guarasugwe (Pimenteira e Costa Marques/RO) à luz da Constituição Federal de 1988 e Convenção 169 da OIT;

02 – Exigimos o cumprimento da pactuação feito pela Funai na demarcação de T.I. com a continuidade dos GT´s Puruborá, Migueleno, Karitiana, Kujubim, Kaxarari e Wajoro todos de RO e inclusão urgente dos Mura e Torá (Humaitá/AM);

03 – Exigimos ação do MPF junto ao Ibama, Sedam, Policia Ambiental e Policia Rodoviária Federal para que coíbam a ação de madeireiros na terra indígena Sakirabiat/RO e demais terras indígenas RO, AM, MT, que sofrem com a conivência da Funai, o que tem provocado a desintegração dos povos e destruição dos recursos naturais;

04 – Exigimos do Programa Terra Legal que respeite os limites onde está em andamento o Grupo de Trabalho da terra indígena Puruborá e Migueleno/RO;

05 – Exigimos o direito à documentação dos povos indígenas que estão na cidade, para garantir acesso às políticas publicas;

06 – Apoiamos a retomada e conclusão do GT para garantir o território do povo Migueleno/RO, considerando a vontade da maioria dos membros deste Povo;

07 – Apurar responsabilidades por envenenamento de rios e igarapés ao longo da BR 429, pelo uso indiscriminado de agrotóxico na frente de expansão da soja, cana, arroz e outros cultivos;

08 – Exigimos ações de fiscalização nos territórios indígenas, pois estes encontram-se em situação de vulnerabilidade devido a Funai não cumprir o seu papel na proteção, defesa e garantia dos territórios indígenas;

09 – Demarcação das terras Cassupá e Aikanã em Chupinguaia, Djeoromitxi, na região de Figueiras, Aruá, Makurap, Tupari, Kampé, Arikapu, Canoé todos no município de Alta Floresta/RO, e Jiahui/AM, Pirineu de Souza (Casa de Rondon – Vilhena/RO-MT), Imediata demarcação das terras indígenas Puruborá (Município de Seringueiras), Migueleno (Mun. São Francisco), Wajuru (Porto Rolim, Alta Floresta), Cujubim (Costa Marques) Cassupá e Salamãi – Porto Velho – RO, Terena – Vilhena; Tawandê e Idalamarê (Comodoro/MT), Mura, Torá  e Apurinã (Humaitá/AM);

10 – Imediata interdição e demarcação das terras dos povos indígenas livres (sem contato voluntário);

11 – Revisão de limites da TI Vale do Guaporé, município de Comodoro, para incorporar a região da Lagoa dos Brincos, onde está localizada a Fazenda Maringá, mas é área tradicional do povo Mamaindê/MT;

12 – Retirada dos invasores e conclusão da regularização da Terra Indígena Rio Negro Ocaia/RO;

13 – Conclusão das revisões de limites das Terras Indígenas Pirineu de Souza (MT), Pacaas Novos, Igarapé Lage e Ribeirão/RO;

14 – Instalação do posto de fiscalização permanente da Policia Rodoviária Federal nas entradas da T.I. Rio Marmelos/AM na rodovia Transamazônica;

15 – Denunciamos que a Funai, vem se posicionando favorável aos fazendeiros, que invadem o território tradicional do povo Karitiana terra já confirmada pelo estudo antropológico da Funai. Reivindicamos que o MPF convoque os fazendeiros e Funai para fazer um Termo de Ajustamento de Conduta, com relação Aldeia Joari e Boyaty Osoaky, T. I. Karitiana/RO;

16 – Urgente reaviventação de picadas das terras Indígenas Demarcadas nos estados de RO, AM e MT porque são vitimas da prática predatória de pescadores, caçadores e outros;

17. Denunciamos os interesses de grandes grupos econômicos em promover a implantação do Credito de Carbono nas Terras Indígenas no estado de Rondônia, Sul do Amazonas.

18. As Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH), construídas ao longo da bacia do Rio Branco, vem há décadas afetando 12 povos indígenas que vivem na Terra Indígena Rio Branco, no município de Alta Floresta do Oeste, inviabilizando atendimentos de emergências no período da seca. A PCH Cascata, no Rio Pimenta Bueno atinge a terra indígena Tubarão Latundê, em Chupinguaia, construída em cima de três cemitérios antigos e afeta o território tradicional dos Aikanã, Cassupá, Salamãi, Massacá e Kwazá;

19 – As hidrelétricas de Jirau e Santo Antonio atingem os povos Karitiana, Uru-Eu Wau Wau, Kassupá, Karipuna, Kaxarari e os povos da região de Guajará-Mirim e Nova Mamoré. Diante das alagações sofridas nos rios Madeira, Mamoré, Pacaas, Rio Negro Ocaia, Sotério e Guaporé por vários povos. Exigimos do MPF inclusão do tema de impacto social nos reestudos das usinas do rio Madeira e cobre reparação da UHE Jirau pelas perdas causadas pela inundação e desaparecimento do peixe nosso alimento tradicional;

20 – Nosso repúdio contra a construção da Hidrelétrica de Tabajara, no rio Machado, que atingirá os povos Tenharin, Jiahui, povos isolados daquela região, Arara e Gavião da TI Igarapé Lourdes, além de outras populações tradicionais e Unidades de Conservação. Já fomos contra a construção dessa hidrelétrica no passado e continuaremos não permitindo mais essa violência contra nossos direitos;

21 – De igual forma nosso repúdio a construção da Hidrelétrica Ribeirão, em Nova Mamoré, Guajará- Mirim. Os povos indígenas daquela região já estão sendo afetados pela Hidrelétrica de Jirau. Agora o governo planeja mais uma hidrelétrica que alagará boa parte de Terras Indígenas daquela região;

22. Denunciamos que o Povo Jiahui sofre com a sobreposição de reserva florestal, onde foi feito acordo de gestão não cumprido pelo ICMBIo.

23. Denunciamos que os Povos Indígenas do Sul do Amazonas e outras lideranças do Estado de Rondônia estão sendo ameaçados em sua integridade física, territorial e cultural pela frente de expansão agropecuária, mineral e madeireira, REDD, sendo criminalizado pela mídia e órgãos governamentais.

24. Exigimos do Estado brasileiro a compensação pelos impactos permanentes causados pela BR 230, Transamazônica, que afetam diretamente os povos Jiahui, Tenharin e Parintintin e denunciamos a posição da Funai em querer deslocar as aldeias ao longo da BR 230, para o interior da T. I.;

25. O Congresso Nacional, através de sua bancada ruralista e evangélica, tem proposto uma serie de Propostas de Emenda Constitucional (PEC) e Projetos de Lei (PL) que rasgam nossos direitos garantidos na Constituição Federal de 1988; que nos desrespeitam como seres humanos, que ferem nossos territórios sagrados e que afrontam a nossa dignidade humana. Como: a PEC 215/2000 que transfere para o Congresso Nacional a competência para demarcar Terras Indígenas e as que ainda não tiveram seu processo demarcatório concluído, também devem passar pela aprovação do Congresso Nacional; PL 7735/2014, de acesso ao patrimônio genético e conhecimentos tradicionais e outros que afetam nossos direitos constitucionais;

26. Exigimos do Estado brasileiro (Executivo, Legislativo e Judiciário) respeito à Constituição Federal do Brasil, respeito aos nossos direitos fundamentais;

27. Denunciamos o roubo do patrimônio genético do povo Karitiana e os saberes tradicionais (canto) do Povo Sabanê, gravado e em comercialização sem autorização do Povo;

28. O Povo Arara se manifesta nesta Assembleia, contrário a possível implantação de Projeto de REDD na Terra Indígena Igarapé Lourdes.

29. Exigimos a criação do CTL em São Francisco do Guaporé, Guajará Mirim, Vilhena, Chupinguaia – RO, Comodoro – MT e  povo Jiahui – AM.

30. Exigimos da Funai agilidade na documentação dos povos Puruborá, Miguelenos, Cassupá, Guarasugwe, Cujubim, Chiquitano, Wayoro e outros.

31. Exigimos que os agentes da Policia Federal, tenham uma formação especifica para atuar e compreender as diferenças culturais dos povos indígenas, sem atropelar e violentar a integridade física e cultural dos povos de RO, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas.

Diante de tudo, renovamos nossa indignação e nossos protestos e exigimos respeito aos nossos direitos tão duramente conquistados pela Constituição Federal de 1988 e na Convenção 169 da OIT, e hoje ameaçados por aqueles que só exploram as riquezas e os povos do nosso País.

Nós somos filhos da Mãe Terra e por ela seguiremos lutando, guiados pelos espíritos de nossos antigos guerreiros.

Porto Velho, 10 de Abril de 2015.

 

Fonte: Cimi Regional Rondônia
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