Mineração – buracos de morte
Camuflar atividades destrutivas e mortíferas com discursos de progresso não mais se sustenta. Os mais de 200 conflitos das mineradoras com comunidades na América Latina são um exemplo claro da resistência aos projetos de mineração. A secular exploração que vitimou milhões de pessoas, especialmente nativos, indígenas no continente, de forma perversa, iníqua e impune, está agora diante de crescente resistência e oposição aos projetos de morte implantados pelas empresas multinacionais.
Esta é uma das constatações feitas no 2° Encontro de “Igrejas e Mineração”, que se realizou essa semana em Brasília. Apesar de estar em curso um incremento da atividade de mineração motivada pela elevação dos preços das commodities em que se transformaram os minérios e com o apoio dos Estados nacionais, os “buracos de morte e destruição” começam a aumentar em quase todos os países do continente. Mais de 60% das grandes mineradoras são Canadenses. Também surgem neste cenário, com grande voracidade, empresas mineradoras chinesas e japonesas.
“Epidemia de resistência”
O seminário Igrejas e Mineração é uma articulação promissora de religiosos (as), leigos e leigas, igrejas, movimentos de pessoas que fizeram uma opção em defesa das comunidades e territórios, motivados pela fé que os unem numa mística e pela espiritualidade que brota de sua presença e compromisso com os atingidos pela mineração. Através da denúncia profética e do testemunho buscam construir espaços de resistência e solidariedade, caminhos de esperança e bem viver.
Favorecer os intercâmbios, as trocas de experiências, através de visitas, encontros e celebrações, são formas de ampliar a resistência, construir alianças e articular estratégias de enfrentamento com as atividades mortíferas do atual modelo de exploração mineral. Foi denunciado a corrupção e cooptação praticadas por empresas de mineração no intuito de quebrar a oposição das comunidades, criminalizando e espalhando o terror e violência nos territórios, especialmente dos povos indígenas, originários.
O Encontro, que contou com quase 100 pessoas de 13 países, foi um momento forte de celebração dos mártires e serviu também para alimentar a esperança de que uma outra América Latina, plural e justa, é possível e urgente.
O genocídio Waimiri Atroari
Esteve também no encontro o primeiro secretário do Cimi, Egydio Schwade, que fez a denúncia da ação genocida da empreiteira e mineradora Paranapanema junto ao povo Waimiri Atroari. Essa realidade está registrada e fartamente documentada no livro “Ditadura militar e o genocídio do povo Waimiri/Atroari”, resultado da convivência e décadas de pesquisa, feita por Egydio, sua família e aliados. Dois dias antes fez o lançamento no Congresso Nacional, numa sessão especial da Comissão de Direitos Humanos.
Em seu depoimento, falou da estratégia do Estado a serviço dos grandes interesses nacionais e multinacionais, que inclusive resultaram na expulsão de sua família da área indígena, bem como de outros missionários do Cimi. “Os Waimiri Atroari são o povo que sem dúvida mais sofreu nos últimos 200 anos. Só no período da construção da estrada BR 174 que ligou Manaus a Boa vista, entre 1967 a 1977, mais de 2000 pessoas desse povo foram mortas por armas, bombas e epidemias”. A estrada não foi feita para beneficiar a população do Amazonas e Roraima, mas para acolher os pleitos da mineradora Paranapanema, desabafou. Tanto é assim que o então presidente da ditadura militar, João Figueiredo, desmembrou em 1981 grande parte da terra indígena para doar à mineradora.
Infelizmente o povo Waimiri/Atroari ainda se encontra num grande cerco de isolamento, organizado por empresas e programas. Romper esse silenciamento, esclarecer o genocídio e punir os responsáveis faz parte dos objetivos dessa publicação, que foi entregue para a Comissão Nacional da Verdade, cujo relatório será entregue à presidenta Dilma nos próximos dias.
Índios do Tocantins denunciam Kátia Abreu
Numa semana de intensa mobilização nos espaços do poder em Brasília, uma delegação indígena representando vários povos do Tocantins denunciou várias vezes as ações e posturas anti-indígenas da senadora Kátia Abreu e disseram à presidente Dilma que não a nomeasse como ministra da Agricultura, pois isso significaria uma afronta aos povos indígenas, populações tradicionais e aos pequenos agricultores e sem terra. Como sinal dessa indignação, afiaram e atiraram suas flechas contra essas figuras, em frente ao Palácio do Planalto. No último dia de suas mobilizações, na sexta-feira (5) estiveram na Confederação Nacional da Agricultura (CNA), protestando contra a política de favorecimento do agronegócio, em suas ações de violência contra a natureza e as populações que resistem a esses projetos.
Na conclusão de suas atividades, fizeram uma visita aos participantes da rede de Educação Cidadã, onde se encontra Frei Beto e aos participantes do encontro internacional ‘Igrejas e mineração’. Agradeceram pelo apoio que manifestaram aos povos indígenas do Brasil em sua heróica luta contra a Proposta de Emenda à Constituição 215/00 e o Projeto de Lei 16 10, ambos ameaçadores dos territórios e vidas dos povos indígenas.
Egon Heck, Secretariado Nacional do Cimi, Brasília, 6 de dezembro de 2014