Indígenas e quilombolas firmam aliança para a demarcação de terras no sertão de PE
Se outrora indígenas e quilombolas do Nordeste resistiram juntos à escravidão, em guerras de libertação, caso da Cabanada, no século XIX, e na articulação entre aldeias e quilombos na luta pela terra, baseada em dinâmicas interculturais, hoje não é diferente para o povo Pankará e comunidades quilombolas localizadas no município de Itacuruba, sertão de Pernambuco.
Neste final de semana ocorreu o 1º Encontro de Comunidades Tradicionais de Itacuruba, envolvendo indígenas e quilombolas. Acossados pelas intervenções desastrosas do Estado brasileiro, seja pela remoção de famílias para a construção da Barragem de Itaparica, que desalojou toda a cidade de Itacuruba, obrigando sua refundação noutro canto de caatinga, seja pelo impacto no rio São Francisco, que já não dá mais peixes como antes, ou pela não demarcação das terras, as comunidades decidiram lutar e resistir juntas, contrariando a postura de Incra e Funai ao alimentar brigas entre os grupos.
As três principais pautas são: luta pela reforma agrária, demarcação das terras tradicionais, além da posição veemente contra grandes empreendimentos que possam afetar as comunidades da região – os traumas das remoções motivadas pela Barragem de Itaparica ainda são latentes, tanto que em tempos de mais seca, quando a cidade em ruínas emerge na água rasa, muitos ex-moradores cogitam voltar para esta Atlântida inundada, mas não esquecida.
Leia na íntegra a carta do encontro:
1º ENCONTRO DAS COMUNIDADES TRADICIONAIS DE ITACURUBA: INDÍGENAS E QUILOMBOLAS
Nós, comunidade quilombola Negros do Gilú, comunidade quilombola Poço dos Cavalos e o povo indígena Pankará, reunidos na Aldeia Pankará Serrote dos Campos, em Itacuruba, Pernambuco, constatamos: Que nossas comunidades vêm sofrendo violações de direitos dos mais diversos tipos, ao longo de nossa história, resultado da ganância das empresas e pela inoperância do Estado brasileiro. Foi assim com a construção da Barragem de Itaparica, quando perdemos parte dos nossos territórios, e está sendo com a lentidão da FUNAI e do INCRA, que além de tudo fica jogando povo contra povo para justificar sua lentidão. Atualmente estamos nos sentindo ameaçados com possibilidade de construção de uma usina nuclear em nosso Município que vai impossibilitar mais uma vez nosso direito territorial.
Reafirmamos a necessidade de demarcar e defender os nossos territórios como forma de garantir as culturas e as vidas das comunidades tradicionais indígenas e quilombola, como também a realização da Reforma Agrária. Sem nossos territórios, perdemos nossa cultura, nossa história e nosso direito de ser indígena e quilombola! Para o Estado brasileiro garantir os direitos das comunidades quilombolas e dos povos indígenas, e em especial no município de Itacuruba – PE, tem que primeiro demarcar nossos territórios, conforme está garantido na Constituição Federal de 1988 e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
Assumimos o fortalecimento da organização das nossas comunidades e a luta conjunta pela demarcação e garantia dos territórios tradicionais das comunidades indígenas e quilombola. Assumimos o compromisso com cada parente de caminharmos de forma conjunta, organizados e unidos por um projeto de vida que garanta a vida digna, o cuidado com a Mãe Natureza, o respeito aos saberes dos mais velhos e à nossa história neste país. Queremos nos juntar ao Papa Francisco quando afirmou, no encontro Mundial dos Movimentos Populares, que “Nenhum sem teto sem casa, nenhum camponês sem-terra, nenhum trabalhador sem direitos”, completando que, NENHUMA COMUNIDADE TRADICIONAL SEM TERRITÓRIO!!!
Itacuruba, 8 de novembro de 2014