Rio Juruena leva Balduíno Loebens para os braços do pai
"Foi localizado, no início da noite do último dia 08, o corpo do padre. Balduíno, no rio Juruena, próximo a Castanheira, vários quilômetros abaixo do local onde foi encontrado seu barco e um chinelo. Balduíno estava desaparecido desde o dia 7. Uma equipe de bombeiros, índios e voluntários estavam realizando as buscas desde ontem", em notícia da Rádio Nazaré de Juína (MT).
Grande tristeza a perda desse companheiro! Durante tantos e tantos anos, subindo e descendo o Juruena, e agora se afoga naquelas águas. Rio Juruena amigo e companheiro de tantas andanças o acolheu, o envolveu em suas águas e o entregou ao Deus da VIDA.
Balduíno morava em Fontanillas, cidade próxima às aldeias do povo Erikbaktsa, onde por mais de 50 anos trabalhou e se comprometeu com a luta desse povo na defesa de sua terra e de sua cultura. Balduíno falava correntemente a língua rikbaktsa!
Devido ao festival de pesca, que acontecia em Fontanillas ele resolveu passar a semana nas aldeias e… parece que coincidentemente visitou todas as aldeias mais próximas, como que se despedindo.
No último dia 7 não apareceu em uma das aldeias, onde tinha combinado de ir almoçar. Preocupados, os índios saíram à sua procura e… encontraram o barco intacto, com tudo dele dentro e… Balduíno desaparecido.
Logo bombeiros e policiais e os indígenas saíram a sua procura. No dia seguinte encontraram um pé de chinelo e só no sábado, à noitinha, quatro rikbaktsa encontraram seu corpo boiando…
O corpo foi levado para Juína e logo o caixão foi colocado na catedral. A multidão do povo que o conhecia muito ali foi chegando, e os rikbaktsa em grande número fizeram um ritual muito significativo. Emoção e homenagens a essa vida entregue pela causa dos povos indígenas.
Sobre o caixão estavam os pertences encontrados no barco: a rede, o remo, o chapéu de palha, uma camisa. Também o material de celebração da missa: o cálice e o folheto da liturgia. E, muito sugestivo, o pé da sandália azul encontrado no rio. Símbolo de suas andanças, de sua inculturação, de sua missão “pé no chão”, de sua simplicidade e despojamento.
Irmã Lourdes Christ falou em nome do CIMI e fez um retrospecto muito bom e sugestivo da vida dele, do tempo da luta pela terra, da repressão que sofreu, da presença e respeito à cultura dos povos e desses últimos anos empenhado na cura através de ervas medicinais.
Hora de mistério, mas de certeza de que esse testemunho de vida coerente e de extrema simplicidade e serviço torna-se semente de novos compromissos evangélicos.
João Inácio Wenzel assim escreve sobre a vida e a missão de Balduíno:
“Balduíno Loebens, lutador incansável pela vida dos povos das florestas. Sua partida súbita traz à memória seu testemunho de inúmeras passagens:
1- Da cultura sulista aos costumes indígenas das florestas amazônicas;
2- Do modo colonialista de evangelizar ao modo de presença libertadora junto ao povo Rikbaktsa;
3- Da evangelização sacramentalista à evangelização inculturada, de valorização e afirmação dos valores;
4- Da perseguição aos pajés à promoção de seus encontros para fortalecer suas práticas tradicionais como fonte de equilíbrio e saúde da comunidade indígena;
5- Dos métodos de saúde tradicional de tratar as suas mais de 60 malárias e da saúde da comunidade, aos métodos naturais, homeopáticos e fitoterápicos de cuidado da saúde;
6- Das grandes estruturas para a presença testemunhal e focal”.
O rio Juruena foi uma das suas grandes companhias. Conhecia sua força e fraqueza, suas armadilhas e seus segredos. Um dia, em tempos de ditadura e forte repressão, o arrancaram do barco para um grande interrogatório de intimidação. Hoje, em tempos aparentemente mais tranquilos, o rio o acolheu em seus braços para a sua passagem derradeira.
Feliz Páscoa, Balduíno!