Retomada das mães ao seu tekoha: pela vida de seus filhos e filhas
Marcando a entrada do acampamento estabelecido na nova retomada, uma cruz de madeira repousa solitária, simbolizando o motivo pelo qual as mulheres não quiseram e nem puderam mais permanecer caladas. A cruz marca o ponto onde o corpo do adolescente Denilson Barbosa, de 15 anos, foi encontrado em fevereiro de 2013. Denílson foi assassinado com um tiro à queima-roupa pelo fazendeiro Orlandino Carneiro Gonçalves, 61, enquanto pescava com o irmão de 11 anos e o cunhado.
A cruz foi colocada ao lado de uma estrada vicinal, onde, assim como Denílson, varias pessoas já foram encontradas mortas e deixadas ao relento, quando não, jogadas dentro de um córrego que corta a área indígena, tendo que ser posteriormente enterradas pelas mãos e lágrimas dos próprios familiares.
Espalhadas nas encostas de um mato, uma dezena de barracas improvisadas servem de moradia para estas mulheres e crianças que enfrentam tanto as dificuldades da falta de alimentação quanto ameaças do fazendeiro e de seus jagunços, que prometem despejá-las da forma que for necessária a qualquer momento. “Aqui só temos alimento uma vez por dia, então tem qu
e escolher se vamos comer de manhã ou à noite. E nossas crianças só comem quando vão pra escola. […] Mas a gente fica com medo mesmo é do fazendeiro, que sempre ameaça a gente, dizendo que ele mais os homens dele vão tirar todo mundo daqui a força”, diz uma das mulheres, que aqui preservamos o nome por questões de segurança.As condições em que vivem os indígenas da aldeia de Pindo Roky foi também um forte motivo que encorajou as mulheres a se movimentar. Segundo elas, enquanto a violência direta dos confrontos tira a vida dos seus filhos e filhas, a demora para finalizar os processos de demarcação da terra de Pindo Roky por parte do governo federal acirra os conflitos e mantém a comunidade indígena em situações desumanas de vida. Sem ter onde plantar, uma vez que não têm acesso pleno a terra, passam fome, e precisam esperar pelas cestas básicas providas pela Funai, cujo atraso da entrega tem durado meses. Sem a mínima estrutura hidrosanitària, convivem com doenças e não têm sequer acesso a água de qualidade, tendo que, para saciar a sede, coletar a água da chuva que fica acumulada nas beiradas dos barracos habitados. Nessas condições, onde a violência se apresenta morando sempre ao lado, se manifestando de forma direta e indireta, as retomadas não são somente um ato de coragem e bravura ou a “intolerância” de um povo que decide por não esperar os procedimentos legais. As retomadas muitas vezes são a única saída que os povos indígenas encontram para conquistarem os seus direitos constitucionais desrespeitados cotidianamente.
Cimi – Regional Mato Grosso do Sul