21/05/2014

Justiça anula reintegrações de posse em três fazendas em Ivy Katu (MS)

A Justiça seguiu parecer do Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul (MPF/MS) e anulou ordens de reintegração de posse em três fazendas que incidem na Terra Indígena Yvy Katu em Japorã, fronteira de MS com o Paraguai e a 477 km de Campo Grande. Na sentença, o juiz afirmou que “não há justo título na propriedade do autor, tampouco posse lícita fundada em terra tradicionalmente indígena que o legitime a ingressar com o presente feito”. Também deixou aberta a possibilidade de indenização ao proprietário pela União “a qual lhe teria concedido título dominial da área demarcada”.

Com isso, já são nove processos de reintegração de posse extintos na Terra Indígena Yvy Katu, de um total de 14. As decisões baseiam-se em outra sentença judicial, de março de 2013, que validou o procedimento demarcatório da terra indígena: “O fato de as terras terem sido esbulhadas dos indígenas pelo próprio Estado não esvazia o direito destes de terem restituídas suas terras”.

Atualmente, os indígenas ocupam a área total da terra indígena (9.494 hectares), correspondente à área de 14 fazendas. A área já passou por estudo antropológico, que confirmou a ocupação tradicional pelo grupo guarani-ñandeva, e foi declarada como terra indígena pelo Ministério da Justiça, através da Portaria 1289/2005. A demarcação física já foi realizada, falta apenas a homologação pela Presidência da República, última etapa de todo o processo, que começou em 1982. Há nove anos os indígenas aguardam a assinatura da Presidência.

Longa luta pela terra

A expulsão dos indígenas de seu território tradicional começou com a criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), através do Decreto nº 9.214 de 15 de dezembro de 1911, que tinha entre suas funções “promover a mudança de certas tribus (sic), quando fôr conveniente e de conformidade com os respectivos chefes”. Esses chefes, como demonstrado pelo MPF, “jamais emitiram qualquer aprovação para serem retirados de suas terras tradicionais, ao contrário, recusavam-se a sair, sendo assim tidos por selvagens”.

Criadas as normas legais, o governo federal passou a retirar os indígenas de suas terras confinando-os em pequenas reservas escolhidas pelo SPI. A União, então, trouxe imigrantes para a região, conferindo-lhes títulos de propriedade. Este foi o modelo adotado para a colonização de Mato Grosso do Sul e está na gênese do conflito fundiário atual.

A reserva de Porto Lindo, em Japorã, para onde foram transferidos os indígenas de Yvy Katu em 1928, foi definida em 3.600 hectares mas sofreu seguidas reduções em função de arranjos entre agentes do governo e interesses de colonos e empresas regionais, sendo demarcada com 2.000 ha. Atualmente, mede 1.648 ha.

Em 1982 começou o procedimento demarcatório da Funai. Para tentar acelerar o processo, em 2003 os indígenas ocuparam as áreas reivindicadas. Com vários pedidos de reintegração de posse ajuizados, a solução adotada foi destinar 10% da área demarcada para ocupação pelos indígenas.

Assim que foi publicada a portaria que determinou a terra como indígena, os proprietários buscaram sua anulação. Sem sucesso em primeira instância da Justiça Federal, eles recorreram no Superior Tribunal de Justiça, que também negou o pedido. O caso foi levado até o Supremo Tribunal Federal, onde os ministros também deram validade para a portaria que definia a terra como indígena.

Em outubro de 2013, os indígenas voltaram a ocupar toda a área declarada pelo governo federal como indígena, para pressionar pela homologação. As ordens de reintegração de posse que foram anuladas referem-se a esta última ocupação.

Fonte: Ministério Público Federal do Mato Grosso do Sul (MPF-MS)
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