Violência pauta reunião com procurador-geral da República
Representantes do movimento indígena e de organizações parceiras estiveram nesta quarta-feira (12) na sede da Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília, para uma audiência com o procurador-geral, Rodrigo Janot. O encontro tratou das demandas indígenas e da representação contra os deputados federais Luiz Carlos Heinze (PP-RS) e Alceu Moreira (PMDB-RS), encaminhada ao Ministério Público no fim de fevereiro.
Lideranças de vários povos estavam presentes para contar os abusos que vêm sofrendo em seus respectivos territórios e de como posições ignorantes, preconceituosas e violentas como as defendidas e proferidas em audiência pública pelos parlamentares ruralistas têm acarretado sérias consequências para a ponta mais fraca da cadeia, os índios.
Astério Porto Ferreira, liderança Tupinambá do sul da Bahia, trouxe na pele o testemunho da barbárie que seu povo tem enfrentado dentro de sua própria terra. “Sofremos ameaça dos fazendeiros há muito tempo. Meu tio, meu avô e vários outros parentes foram mortos por pistolagem, em tentativas de tomarem nossas terras. Os deputados dizem publicamente que se a justiça não resolve o problema, que os fazendeiros devem resolver por conta própria, então eles se sentem no direito de nos matar”, afirmou.
Aflito, ele contou ainda que, na última sexta-feira, 07 de março, pela manhã, um grupo de jagunços fortemente armados – dentre eles dois ex-policiais contratados para segurança privada de fazendeiros da região – invadiram a aldeia Encanto da Patioba, no município de Itapebi, e espalharam o terror e o medo pela comunidade. “Eram cerca de 18 homens, portando armas que eu nunca tinha visto. Nos atacaram, algemaram e espancaram”, disse Astério, mostrando as marcas de facadas e hematomas pelo corpo.
Segundo o relato, três homens, duas mulheres e duas crianças foram rendidas, dois idosos e um casal foram espancados, animais domésticos e de criação foram mortos, pertences foram roubados e uma das mulheres foi ameaçada de estupro. Antes de irem embora, os pistoleiros ainda incendiaram as 28 casas de 48 famílias da aldeia. “Pedimos roupa emprestada dos outros para vir pra cá, doutor. E o que nós queremos é apenas que demarquem nossas terras. Sem isso, estamos à mercê das armas desses homens para sobreviver”, completou.
Também foi demandado ao procurador-geral da República posições sobre a PEC-215 e o PLP-227, além da Portaria 303 da AGU, que ferem direitos constitucionais dos povos tradicionais. Quanto a isso, Janot afirmou que esteve reunido recentemente com alguns deputados da bancada ruralista no Congresso e que lhe foi pedido um parecer sobre as duas primeiras propostas.
“Num juízo prévio, pois ainda não analisamos a fundo, nós previmos uma série de inconstitucionalidades nos dois projetos. Encaminhamos isso a eles, que estão avaliando por lá. Portanto já existem duas notas técnicas nossas atestando inconstitucionalidades”, garantiu. Uma das notas citadas pelo procurador foi anexada ao mandado de segurança apresentado pela Frente Parlamentar de Defesa dos Direitos Indígenas contra a tramitação da PEC, no ano passado.
Rosanne Kaingang, coordenadora da ARPINSUL (Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul), frisou que é necessário e urgente um posicionamento e uma atitude por parte do governo federal quanto aos atos de violência contínua e cerrada. “Cada novo ato administrativo que atenta contra os direitos indígenas, seja no Legislativo ou no Executivo, é mais uma arma que os ruralistas usam contra nós, e enquanto isso não vemos nenhuma punição. Passou da hora de começar a punir. Senão, só vai morrer índio”, defendeu.
A representação, assinada por diversas organizações indígenas e da sociedade civil e protocolada na PGR, solicita que os deputados Luis Carlos Heinze e Alceu Moreira sejam investigados por crimes previstos no Código Penal, como incitação pública ao crime, apologia ao crime ou criminoso, formação de quadrilha ou bando e racismo ou injúria qualificada.