29/05/2013

Essa terra tem dono, Palácio do Planalto! Nota de repúdio contra a suspensão de demarcações na região Sul

Indígenas Guarani Xeripá do acampamento Mato Preto. Foto: Renato Santana/Cimi. Lideranças Kaingang e Guarani dos estados do Rio do Grande do Sul (RS), Paraná (PR) e Santa Catarina (SC), realizaram três grandes reuniões, com o objetivo de estudar a conjuntura anti-indígena, discutir a situação das retomadas de Terras Tradicionais e articular-se no fortalecimento do movimento. A primeira reunião aconteceu no último dia 14 de maio, na Terra Indígena (TI) Lajeado do Bugre, entre os caciques que estão na luta por retomadas de terra no norte do RS. Outra aconteceu em Chapecó (SC), no último dia 20 de maio, reunindo mais de 100 lideranças Kaingang e Guarani de toda região Sul. E a última aconteceu no dia 23 de maio, na TI Serrinha, onde se encontraram mais de quarenta caciques e outras lideranças.

 

“É lamentável que em pleno século XXI esteja acontecendo isso com os Povos Indígenas do Brasil”. Essa foi a frase inicial da liderança Kaingang Luis Salvador, referindo-se ao projeto do governo atual. Modelo econômico desenvolvimentista, altamente dependente da exploração e exportação de matérias-primas, produção de commodities e construção de infraestrutura. Essa situação acirra ainda mais a disputa pelo controle dos recursos naturais e de espaços territoriais existentes no país. Nesse contexto entra a exploração dos territórios indígenas, de outras populações tradicionais e do meio ambiente. Processo esse, assumido pelo governo, nos seu s três poderes (Legislativo, Judiciário e Executivo), aliando-se ao agronegócio.

 

Para o sistema capitalista “somos considerados como incapazes, e somos ‘incapazes’ de produzir o que ‘eles’ querem”. Essa foi a fala de Leonir Franco, ao denunciar o preconceito sofrido pelo povo indígena e a ganância demolidora do capitalismo. “Não queremos terra para ficar rico. Deixar o mato crescer, dar futuro a nossas crianças e viver é o que queremos”, disse Luiz Tiago, também liderança Kaingang.

 

Nessa batalha desigual, o setor dominante utiliza-se de armas poderosas, de forte poder destrutivo e letal. O cacique Roberto dos Santos denuncia isso ao afirmar que: “Existe uma forte política anti-indígena que quer mexer na Constituição Federal de 1988 e no Decreto 1775, alem de afetar o único órgão federal indigenista”. Para agravar a situação, manobras políticas eleitoreiras de mandatários dos poderes executivos e legislativos (nacional e estadual), inclusive das bancadas evangélica e agropecuária, estão incitando a violência entre indígenas e pequenos agricultores no norte do RS. Sabendo que ambos são vítimas do processo histórico, o qual ao longo de 513 anos vem massacrando, exterminando e excluindo os povos indígenas. Esta postura não contribui ao Estado Democrático e de Direito, mas instiga a segregação, a violência e preconceito. Do lado dos Kaingang e Guarani do RS sempre houve respeito aos direitos dos agricultores das terras indígenas. Porém, como lembra a liderança Luis Tiago, a luta deve ser pela recuperação das terras tradicionais: “os agricultores têm seus direitos, mas não devemos ter medo de recuperar nossas terras”.

 

Entre as armas utilizadas pelo governo e setores a ele ligados, está a judicialização dos processos de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas. Também as constantes situações de violências que as lideranças e comunidades sofrem, são resultantes do prolongamento e não conclusão dos processos demarcatórios. Entre essas aramas estão as tentativas de alteração na legislação brasileira, tais como: as Propostas de Emenda à Constituição (Ex.: PECs 215 e 37/2007); Portaria 303 da AGU; e o anúncio de mudanças no procedimento demarcatório através de Decreto da Presidência.

 

Diante da complexa conjuntura que ameaça a vida e os direitos dos Povos Indígenas, as lideranças se questionam: “Como enfrentar o governo e essa política que esta aí tirando ‘bem de vagarinho’ nossas terras e direitos?”, tal como disse Roberto dos Santos, cacique Kaingang. A resposta é uníssona: unir as forças, mobilizar todas as comunidades, discutir, resistir e lutar pelos direitos garantidos na Constituição Federal de 1988.

 

O Cimi, solidário e comprometido com a causa indígena, denuncia que os discursos de integrantes do governo federal, especialmente da ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann, contra as demarcações das terras, têm gerado, nos estados do Sul do Brasil, um clima de tensão e de violência contra comunidades indígenas. O governo ao anunciar que adotará medidas administrativas e políticas para paralisar as demarcações das terras promove, junto à opinião pública, discursos de intolerância e de preconceito contra as pessoas indígenas e quilombolas e contra seus direitos, como se estes fossem privilégios.

 

No entender do Cimi o governo federal será o grande responsável pelo agravamento das relações entre indígenas e agricultores no Sul do Brasil e pelas consequentes violências advindas desta relação, uma vez que, ao invés de resolver os problemas, o governo os aprofunda com um único objetivo: assegurar para si o apoio da bancada ruralista, que se constitui, no atual contexto, no maior “partido político” do Congresso Nacional.

 

Chapecó, 28 de maio de 2013.

 

Conselho Indigenista Missionário – Regional Sul

 

Fonte: Cimi Regional Sul
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