29/01/2013

“Ainda estamos vivendo em um hectare de terra”

Por Ruy Sposati,

de Iguatemi (MS)

Apesar da aprovação do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena (TI) Iguatemipegá I, no município de Iguatemi, região da fronteira do Mato Grosso do Sul com o Paraguai, indígenas de Pyelito Kue ainda estão inseguros sobre seu futuro. Em reunião do conselho do Aty Guasu, lideranças de diversos tekoha – “o lugar onde se é” ou aldeia – avaliaram o momento político vivido pela comunidade.

Para a liderança de Pyelito, Líder Solano Lopes, “[a publicação dos estudos de] Pyelito foi uma vitória, foi um passo grande. Mas foi só um momento”, aponta. “Ainda estamos vivendo nesse pedaço de um hectare de terra, com muitos problemas”.

“Nós não temos acesso a nada. O lugar que nós estamos tem entrada saída muito difíceis. Na época de frio, precisamos enfrentar o rio. As crianças precisam estudar. Ninguém está vindo cuidar da saúde. Aqui não dá pra plantar, precisamos de mais terra. Precisa abrir uma estrada urgentemente”, acusa Líder.

Reunião do Aty Guasu em Pyelito Kue (Ruy Sposati/Cimi)

Para a liderança Kaiowá Oriel Benites, do Aty Guasu – grande assembleia Guarani e Kaiowá -, a publicação foi saldo de um intenso processo de luta realizado em 2012, que constrangeu o governo a ponto de acelerar o processo demarcatório da terra indígena. “Ano passado tivemos muitas viagens. Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte… A luta foi muito grande”, expõe. “Pyelito Kue avançou muito porque lutou, porque escreveu. Assim, conseguiram várias opiniões publicas [favorávei], pressionaram muito e o governo abriu mão e reconheceu como terra indígena. Mas tem muitas outras na mesma situação [sem estudos publicados], que estão na mesma condição de urgência”, diz. Além da terra, Oriel sustenta ser necessário a consecução de programas de governo que garantam a sustentabilidade e autonomia das comunidades. “A terra está voltando [para os indígenas] toda devastada, sem floresta”, afirma.

NEM 5%

A área identificada com 41.571 hectares de extensão é parte do Grupo de Trabalho (GT) da Bacia Iguatemipeguá, localizada nas proximidades da Terra Indígena Sassoró. “Isso não é nem 5% do que o povo Kaiowá reivindica”, afirma o coordenador regional do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) do Mato Grosso do Sul, Flávio Machado.

Os Guarani e Kaiowá reivindicam pelo menos outros 70 tekoha no Estado. Essas aldeias se inserem em outros territórios reivindicados pelos indígenas, organizados pela Funai em outros cinco GTs, responsáveis pela identificação das terras no MS. “Até quando vamos permitir situações como essa, onde, para conseguir a terra, famílias tem de estar dispostas a morrer, precisam ameaçar uma morte coletiva?”, questiona.

 

GT de Pyelito é o único em seis publicado pela Funai (Ruy Sposati/Cimi)

Segundo o coordenador, outros relatórios de GTs de terras Guarani e Kaiowá foram entregues à Funai há mais de um ano, como no caso do GT da TI Douradospeguá, cujos estudos foram entregues pelo antropólogo à Fundação em novembro de 2011 e até hoje não foram publicados. “A decisão do governo foi puramente política, frente ao constrangimento da carta de Pyelito. E há terras indígenas nessa situação há mais de 20 anos, onde quase nada foi feito”. No contexto da carta da comunidade, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, deu um prazo de 30 dias para o órgão indigenista oficial despachar o relatório técnico.

No fim do ano passado, a comunidade de Pyelito divulgou uma carta afirmando a decisão de resistir em suas terras até as últimas consequências, o que despertou a atenção da opinião pública nacional e internacional.

Cerca de 1.800 indígenas habitam o território identificado pelo estudo, que comprovou que aquele território é de ocupação tradicional das famílias Kaiowá dos tekoha – Pyelito Kue e Mbarakay.

Proprietários rurais – entre eles, o da Fazenda Cambará, que incide sobre Pyelito – tem 90 dias, a partir da data de publicação, para se manifestar sobre o relatório. Posteriormente, a Funai revisará o documento e encaminhará ao Ministério da Justiça, que deverá publicar a portaria declaratória da TI.

Com informações da Funai

 

 

Fonte: Assessoria de Comunicação-Cimi
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