Yanomamis querem brigar na justiça contra a criação de unidades de conservação
Elaíze Farias,
de Manaus
A CRÍTICA – A Hutukara Associação Yanomami (HAY) promete entrar na justiça caso a criação de três unidades de conservação (duas federais e outra estadual) dentro do território do Amazonas não seja revista.
A associação Hutukara afirma que a Floresta Nacional Amazonas, o Parque Nacional Pico da Neblina e o Parque Estadual Serra do Aracá estão sobrepostas (dentro) da terra dos índios yanomami. O Parna Pico da Neblina foi criado em 1979. O Flona Amazonas, em 1989 e o Parest Serra do Aracá, em 1990.
Em agosto passado, a Hutukara enviou ofício ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS) solicitando a retirada das unidades de conservação da Terra Indígena Yanomami. O presidente da Hutukara, Davi Kopenawa, chegou a se reunir em Manaus com coordenadores do ICMBio. O envio dos documentos, porém, foi tornado público somente nesta terça-feira (11) pela entidade.
RESTRIÇÃO
Nos documentos, Davi Kopenawa diz que a sobreposição “restringe em demasiado a autonomia dos yanomami sobre o uso dos seus recursos naturais neste Estado (Amazonas), como também torna complexa a gestão e fiscalização da TI Yanomami, que envolve um número expressivo de agências governamentais estaduais, federais e não-governamentais”.
Davi Yanomami diz ainda que o Parque Estadual Serra do Aracá foi criado em 1990, ocupando 85% da extensão da terra indígena, sem haver prévios estudos socioambientais que detalhassem a sua realidade e justificassem seus limites.
Em outro documento, a Rede Rio Negro, composta por organizações indígenas e não-indígenas e da qual faz parte da Hutukara, diz que a Flona Amazonas foi criada para excluir a ocupação tradicional dos indígenas e assim permitir a exploração dos recursos florestais por terceiros, conforme consta expresso no Decreto 97.546/1989. Para a Rede, o decreto “afronta o direito constitucional dos yanomami de posse permanente sobre a terra e de usufruto exclusivo sobre os recursos naturais nela existente”, diz o documento.
Questionado pela reportagem a respeito do pedido enviado ao ICMBIo e à SDS, diretor da Hutukara, Dário Kopenawa, disse nesta quarta-feira (12) que a associação está tentando resolver esta situação da sobreposição de forma administrativa com o ICMBIo e o Governo do Estado do Amazonas. “Caso as articulações administrativas não resultem no resultado esperado, a Hutukara Associação Yanomami (HAY) irá até a Justiça, Ministério Público Federal ou exigir o respeito que as terras Indígenas devem ter”, disse Kopenawa.
ICMBIO
Procurada para falar sobre o assunto, a chefe da Flona Amazonas, Keuris Kelly Silva, disse que embora tenha sido criado em 1989, a gestão desta UC foi iniciada somente em 2009 com a designação de dois analistas ambientais para a área.
Ela afirmou que os trabalhos iniciais se concentraram na criação de conselho gestor, conjuntamente com o Parna Pico da Neblina. Contudo, os trabalhos de formação do conselho gestor estão interrompidos justamente em função dos questionamentos da Hutukara e da última assembléia dos yanomami.
Segundo Keuris, o Parna Pico da Neblina, por não ter os trabalhos interrompidos, formou seu conselho gestor em 2012 com a participação de lideranças indígenas como membros,
“Todos os documentos recebidos foram enviados para a sede do ICMBio, em Brasília, onde se encontra aberto um processo para análise do pedido de desafetação da unidade.
Ressalto que as atividades de fiscalização continuam nas áreas fora de sobreposição”, disse.
A assessoria de comunicação do ICMBio, em Brasília, também foi contatada nesta quarta-feira mas até o término desta matéria não retornou ao pedido de informação.
Já a assessoria de imprensa da SDS respondeu, por meio de nota, que o Parest Serra do Aracá foi criado em março de 1990 (Decreto no. 12836) com uma área de 1.800 milhões de hectares.
Na nota, a SDS diz que o plano de gestão encontra-se em fase final de elaboração. A consulta pública foi realizada em dezembro de 2010.
“Ressaltamos que a implementação das unidades de conservação se dá através desse documento técnico, onde no Estado do Amazonas, 80% das UCs são de Uso Sustentável, sendo estas as áreas consideradas prioritárias, tendo em vista que ali residem e fazem uso cerca de 10 mil famílias. O Parest Serra do Aracá, pertence a categoria de Proteção Integral e, desde a sua criação, as terras indígenas ali existentes foram reconhecidas pelo Estado do Amazonas”, diz trecho da noite.
A SDS diz ainda que durante o processo de elaboração do Plano de Gestão, as populações indígenas e representantes, inclusive, a Associação Hutukara Yanomami, participaram ativamente sendo recebidos pelo corpo técnico do Ceuc e participando de reuniões neste Centro.
O órgão confirma que a Hutukara protocolou o pedido de revisão e diz que o documento está incluído no processo do Plano de Gestão e será fundamental para a redelimitação das áreas.
“A SDS reconhece a legitimidade do pedido de exclusão das áreas indígenas que representam aproximadamente 83% do Parest. A solicitação da Associação Hutukara Yanomami, bem como das demais associações, é legítima. Certamente esse pleito será apreciado pelo Comitê Técnico que a SDS vai criar no mês de outubro”, diz.
O Comitê vai contar com órgãos como Fundação Nacional do Índio (Funai), Procuradoria Geral do Estado, entre outros, além da própria Hutuara.