16/06/2012

Preservação ambiental depende de garantia de direitos, apontam lideranças indígenas

Por Renato Santana,

do Rio de Janeiro

 

 

Enquanto na Rio+20 uns poucos representantes definem o destino de milhares de indivíduos e do próprio meio ambiente, na Cúpula dos Povos das Américas, instalada no Aterro do Flamengo, Rio de Janeiro, os povos indígenas do Brasil iniciaram os trabalhos, neste sábado, 16, do 9º Acampamento Terra Livre, sob o tema: A salvação do planeta está na sabedoria ancestral dos povos indígenas.    

 

Durante a manhã, as delegações se apresentaram para um plenário com mais de mil indígenas – que chegaram nesta sexta-feira, 15. “Não queremos mineração em nossas terras; não desejamos vender a nossa natureza; não queremos saber de hidrelétricas: Kayapó não veio aqui só para mostrar costumes. Viemos para dar o recado de que não estamos gostando do que o governo faz e vamos ir para a luta”, disse a liderança Megaron Txucarramãe, do Mato Grosso. Do vizinho Mato Grosso do Sul, lideranças Guarani Kaiowá protestaram contra a violência no estado e pela demarcação das terras de ocupação tradicional. 

 

Sônia Guajajara, integrante da Articulação dos Povos Indígenas Brasileiros (Apib), apontou que as ações desenvolvimentistas do governo federal não são responsáveis e tampouco levam em consideração o meio ambiente. “Os indígenas são preservadores naturais, pois não sabemos viver longe da terra, dos rios, das matas. Não exploramos o meio ambiente, mas mantemos uma relação de troca. Temos muito a ensinar e queremos ser ouvidos, com nossos direitos preservados”, declara.

 

Temas como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que define, entre outros pontos, a consulta prévia aos povos indígenas que tiverem terras impactadas por obras de grande empreendimento, serão debatidos na Rio+20.

 

A construtora Oderbrecht, o consórcio Norte Energia, a mineradora Vale e madeireiras do Acre participam da atividade, em local a 40 km da Cúpula e protegido pelo Exército: a intenção é mascarar as destruições ambientais e sociais causadas pelas ações destes grupos, destacados executores do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e, ao mesmo tempo, símbolos da opção de desenvolvimento adotado pelo governo federal.

 

Quem desembarca no Rio de Janeiro é inundado de propagandas das principais causadoras de impactos irreversíveis em terras e comunidades indígenas; se liga a televisão. A campanha destas corporações é de respeito à natureza e aos povos que nela vivem, mas a verdade é bem diferente daquilo que está para inglês ver na Rio+20.

 

“O progresso que estamos vendo na verdade é a dizimação dos povos indígenas. A Rio+20 é um local de decisões onde os indígenas, quilombolas e demais povos não participam”, atacou Ninawá Huni Kuĩ, do Acre. Ele afirma que em seu estado existe “uma grande mentira” ao redor do desenvolvimento sustentável apregoado pelo governo Tião Viana. “Tem muita madeira ilegal retirada de área indígena. No Acre, os gados dos fazendeiros são vacinados e os indígenas não, que seguem morrendo de doenças simples”.

 

PEC 215 e demarcação   

 

Durante a apresentação dos povos do Sul, o cacique Augusto Kaingang, do Rio Grande do Sul, frisou a questão da terra: “Estamos no meio do ano e a Funai (Fundação Nacional do Índio) executou apenas 2% dos recursos destinados para a retirada de ocupantes das terras indígenas demarcadas. Isso não podemos aceitar”.

 

Por outro lado, Augusto mostrou preocupação com a tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal. A PEC 215, proposta pela bancada ruralista e evangélica, visa transferir do Poder Executivo o ato administrativo de demarcação de homologação das terras indígenas para o Legislativo. “Chamo isso de projeto genocida. Querem as terras dos índios. O governo não cumpriu com a palavra e nossos direitos constitucionais ainda não são cumpridos”, afirmou.

 

Maurício Guarani Mbyá, também do Rio Grande do Sul, ressaltou que o ATL não é mera coincidência de acontecer na Cúpula, de forma paralela à Rio+20: “Aqui temos ideias diferentes das apresentadas lá, além de direitos violados. Temos que discutir esses ataques e como vamos nos mobilizar por aquilo que a Constituição diz que temos. O governo precisa tomar vergonha na cara”. A fala da liderança Guarani Mbyá não trata apenas da realidade do próprio povo.

 

Durante o Dia Mundial do Meio Ambiente, a presidenta Dilma Rousseff assinou alguns decretos envolvendo a questão indígena; para o bem e para o mal. Uma das medidas foi a oficialização e ampliação do Parque do Descobrimento, no extremo sul baiano. O problema é que o território de 22.678 hectares é reivindicado pelo povo Pataxó como área de ocupação tradicional – a Funai, inclusive, está com procedimento de identificação em andamento. Dentro das terras existem cinco comunidades indígenas.

 

“Cabral invadiu essas terras e nossos antepassados sofreram. Não mudou muita coisa, porque retiram os direitos e destroem a natureza. Sentimos na alma, como se fosse em nosso corpo”, declarou Karuan Pataxó.    

 

     

 

 

Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi
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