23/02/2012

Informe n° 1003: Jagunços bloqueiam estrada e liderança Pataxó Hã-Hã-Hãe morre sem assistência médica

Renato Santana

de Rio Branco (AC)

 

Morreu na manhã desta quinta-feira (23) a liderança Pataxó Hã-Hã-Hãe José Muniz de Andrade, 40. O indígena estava em área recentemente retomada na região das Alegrias, município de Itajú do Colônia, quando começou a sentir dores no peito e estômago. Um carro foi enviado para prestar socorro, mas impedido de acessar a retomada para prestar socorro a José Muniz.

 

Representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e Polícia Federal (PF) se dirigiram ao local para encaminhar o corpo ao Instituto Médico Legal (IML) de Itabuna (BA). Quando chegaram à estrada de acesso ao local da retomada foram surpreendidos por jagunços armados, além de paus e pedras impedindo a passagem dos veículos.

 

"Tudo indica que tenha sido enfarte a causa da morte. No entanto, está claro que os jagunços impediram a passagem para o atendimento médico", declara o chefe da Coordenação Técnica da Funai local, com sede no município de Pau Brasil, Wilson Jesus. O servidor da Funai ressalta que a tensão está concentrada na região das Alegrias.

 

A morte causou revolta na comunidade e deixou ainda mais tensa a conturbada relação entre jagunços – contratados para expulsar os indígenas das terras retomadas – e os Pataxó Hã-Hã-Hãe. A PF requisitou reforços e espera autorização do Ministério da Justiça para permanecer nas áreas de conflitos de forma permanente.

 

"Os fazendeiros são organizados em toda a região e sempre atacam os indígenas quando ocorrem as retomadas de terras de ocupação tradicional, mas os Pataxó Hã-Hã-Hãe resistem", explica o servidor da Funai.

 

Mais três retomadas

 

Nesta quinta-feira mais três áreas de ocupação tradicional foram retomadas e totalizam 48 desde o dia 1° de janeiro deste ano, quando os Pataxó Hã-Hã-Hãe iniciaram uma série de retomadas de terras que aguardam decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) há 30 anos. A Ação Cível Originária (ACO) 312 pede que os títulos das propriedades rurais sejam considerados nulos.

 

Em 2008, Eros Grau, relator do processo, recebeu os indígenas e seu voto foi pela nulidade dos títulos. Hoje está aposentado do STF, mas tanto o voto como a relatoria não perdem a validade. Segue na votação, conforme a pauta, a ministra Carmem Lúcia. Em setembro de 2011, a votação foi adiada por duas vezes.

 

Conforme relatou o ex-ministro, a perícia antropológica demonstrou a existência permanente de índios na região desde 1651, "o que atesta a identidade do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, bem como a ligação de seus integrantes à terra, que lhes foi usurpada", de acordo com o texto.

 

O relatório de Eros Grau salienta ainda que o argumento de que não é necessária a prova de que as terras foram de fato transferidas pelo Estado da Bahia à União ou aos índios, "ao fundamento de que disputa por terra indígena entre quem quer que seja e índios consubstancia, no Brasil, algo juridicamente impossível". Considera, assim, que títulos oriundos de aquisição a non domino (aquilo que não é proveniente do dono) são nulos.

 

Nenhum fazendeiro mais

 

As três retomadas desta quinta ocorreram na região de Mundo Novo, dentro do município de Pau Brasil. As demais se estendem aos municípios de Itajú do Colônia e região de Jacareci, município de Camacã. Todos os latifundiários foram retirados das terras e mais nenhum permanece nas terras tradicionalmente comprovadas como indígenas, conforme informações da Funai, exceto na área do rio Pardo.

 

Fonte: Cimi - Assessoria de Comunicação
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