Nove anos depois do assassinato do cacique Verón, expedição registra conflito de terra no MS
Expedição de profissionais ligados à questão indígena e militantes de diversas áreas ficará até o dia 25 na região acompanhando a situação dos indígenas. Iniciada no último dia
Por Fábio Nassif, da aldeia Takwara (Mato Grosso do Sul)
No último dia 13 de janeiro, há nove anos do assassinato do Cacique Marco Verón, liderança guarani-kaiowá de Mato Grosso do Sul, indígenas da aldeia Takwara fizeram uma cerimônia em sua homenagem. O cenário ainda é de violenta e cotidiana disputa pelas terras. A cerimônia, chamada de Yvy ra’i nhamboaty, foi realizada durante uma expedição de profissionais ligados à questão indígena e militantes de diversas áreas, que ficará até o dia 25 na região acompanhando a situação dos indígenas.
Iniciada no último dia
Motivada pela morte de 260 indígenas nos últimos nove anos, a expedição, composta por geógrafos, jornalistas, psicólogos, advogados e educadores, tem se deparado com os problemas vividos nas aldeias. A pressão do agronegócio – principalmente da cana e da soja -, a violência dos fazendeiros, jagunços e empresas de segurança privada, a ausência – ou presença equivocada – do Estado fazem do Mato Grosso do Sul um dos principais palcos de mortes indígenas.
Portas fechadas
No dia em que a equipe da expedição foi recepcionada pelos guarani-kaiowá na aldeia Laranjeira Nhánderu, localizada no meio de uma plantação de soja no município de Rio Brilhante, os responsáveis pela fazenda colocaram caminhões e um globo de aço de arar terra na entrada para impedir a circulação de pessoas no local. Dentro de caminhonetes, homens armados rondaram a entrada da aldeia, deixando todos em estado de alerta.
O gesto de intimidação foi respondido por contados da expedição com a Funai, a Polícia Federal e entidades de direitos humanos. Para evitar mais um ataque aos indígenas, decidiu-se telefonar para o representante do Ministério da Justiça, Marcelo Veiga, para reforçar o envio de ajuda aos indígenas.
Três agentes da Polícia Federal e dois da Funai chegaram ao local, e, depois de conversar com os donos da fazenda, se entenderam com os índios. A presença deles ajudou no desbloqueio do caminho, mas explicitou as limitações desses órgãos para lidar com este tipo de confronto.
Diferente do entendimento comum de que a Funai deve defender os direitos indígenas, a responsável pelo órgão no estado, Maria de Lourdes, afirmou que "o papel da Funai é mediar conflito entre os fazendeiros e os indígenas", mesmo em casos como esse, onde a terra está em litígio (aguardando julgamento) e historicamente pertence aos guarani-kaiowa. Maria de Lourdes reconheceu que, em algumas áreas onde a expedição pretende passar, a Funai e a Polícia Federal não atuam devido ao poder e agressividade dos fazendeiros.
Injustiça e violência
Também cercada pelas enormes plantações de soja, a aldeia Taquara vive situação semelhante: rios poluídos pelo despejo de agrotóxicos, tamanho limitado das terras que impede o plantio para subsistência, indefinição jurídica do local e ameaças de morte. O cacique Ladio Veron é um dos que estão marcados para morrer na lista dos fazendeiros. Ele passou o seu aniversário lembrando do dia em que os jagunços o seguravam, enquanto matavam seu pai na sua frente. Os assassinos, mesmo condenados, vivem em liberdade.
Nos locais do assassinato e enterro do corpo do cacique Marco, sua filha, Valdelice, segurando a neta Arami, reafirmou que "a luta do povo guarani-kaiowa não vai parar". A água da chuva se misturou com as lágrimas desta família, pertencente a um povo que resiste e vê sangue jorrar em suas terras, desde a colonização até agora, quando o projeto de desenvolvimento do país os condena à luta com fazendeiros e à morte por envenenamento por agrotóxico.