Não passarão, por Egon Heck
Noite de saudade e de lágrimas indignadas. De memória perigosa, de denúncia e anúncio. Noite de saudar lutadores e lutadoras do Brasil e do mundo. Mas em especial uma noite de conclamação e certeza: as forças da morte, das ditaduras, da tortura, dos seqüestros e ocultamento dos corpos, da acumulação e da opressão não vencerão, não passarão!
A Assembléia Legislativa da agitada e cinzenta São Paulo foi palco da 15ª. Sessão Solene de entrega do Prêmio de Direitos Humanos Santo Dias para destacadas(os) guerreiros e lutadores e entidades combativas do país.
Dentre as homenageadas, as mães de maio e a Dr. Michael Nolan, uma incansável batalhadora da justiça, dos direitos dos moradores de rua, dos encarcerados, dos povos indígenas e quilombolas.
Depoimentos emocionados e de alerta por aqueles que passaram pelos porões da ditadura, da tortura, da repressão e violação dos direitos humanos. “Ainda precisamos lutar muito para ter um efetivo Estado Democrático de Direito”. Não um estado a serviço dos privilégios de uns poucos, um estado que é verdade para os poderosos, mas é uma mentira para a classe popular. “Estamos longe de construir um país para todos. Uma nação de honre e respeite sua pluralidade e tenha a justiça e igualdade social como princípio e prática”.
Os Kaiowá Guarani na noite dos Direitos Humanos
Enquanto era lembrada a memória de centenas de “desaparecidos” por uma polícia que eliminou inúmeros lutadores e guerreiros deste país, os Kaiowá Guarani denunciavam que a mesma estratégia estava sendo utilizada pelas milícias armadas e pistoleiros, que ocultaram os corpos de Rolindo Vera e Nisio Gomes.
Dr. Michael Nolan, sob forte emoção, circulou pelo ambiente como reconhecida lutadora, guerreira defensora dos direitos dos pobres e oprimidos. Na hora da premiação esteve acompanhada pelos Kaiowá Guarani Oriel, Faride e Léia, que vieram do Mato Grosso do Sul, para dar seu grito pelos direitos e vida de seu povo. Ao conceder parte de seu tempo para Léia, Michael lembrou seu compromisso de estar atuando na defesa de vários casos de violência contra esse povo, nas últimas décadas.
Léia lembrou a história de sofrimento, massacre e resistência dos Kaiowá Guarani. “O corpo do cacique Nisio, assassinado há menos de duas semanas, continua desaparecido. Queremos justiça, exigimos justiça”. Ela é da terra indígena Nhanderu Marangatu, onde foi assassinado Marçal de Souza, Dorvalino e muitos outros que tombaram na luta pela terra e pelos direitos de seu povo. Os assessores teológico e de comunicação do Cimi Nacional estiveram presentes, além da equipe local e do Cimi Regional Mato Grosso do Sul.
Do luto à luta
Além de lembrar as lutas e lutadores dos direitos do povo, como Santo Dias, Mariguela e centenas de vitimas de um estado repressor e protagonista de constantes violações dos direitos humanos, foram feitas homenagens, a personalidades mundiais de luta pela vida, justiça e direitos humanos, como Nelson Mandela, dentre outros.
Foi lembrado um poema de Cecilia Meirelis:
“Toda vez que um justo grite
Um carrasco vem calar
Quem não presta fica vivo
Quem é bom mandam matar”.
Com muita emoção e dignidade, a sessão foi até mais de onze horas da noite. Um momento memorável de homenagem aos lutadores na linha de frente na defesa da vida e da justiça, da construção de uma nação, de um efetivo Estado de direito democrático. O pastor Ariovaldo Ramos, homenageado, lembrou: “Temos um Estado, temos um Território, mas só teremos uma Nação quando os direitos de todos forem respeitados”.
Egon Heck,
Povo Guarani Grande Povo, 6 de dezembro de 2011.