24/11/2011

A dor dos corpos roubados

Egon Heck

Dia 31 de outubro de 2009. Os Kaiowá Guarani acampados no tekohá Ypoí são atacados. Vários índios são feridos, os barracos destruídos. Os professores Guarani Jenivaldo e Rolindo são levados pelos assassinos. O corpo de jenivaldo foi encontrado no rio Ipo’y, sete dias depois de raptado. O corpo de Rolindo até hoje não foi localizado.

Em dezembro de 2009. O grupo do tekohá  Mabarakaí, município de Iguatemi, retornou , pela segunda vez, a seu Tekohá. Poucos dias depois são atacados por jagunços, resultando vários feridos, dentre os quais Arcelino Texeira, de 22 anos. Sua mãe, em depoimento, afirma que viu o corpo do filho estendido no chão. O corpo nunca foi encontrado.  Com lágrimas a mãe narra os acontecimentos.

Dia 18 de novembro 2011. O cacique Nisio do tekohá Guaiviry é morto com três tiros de espingarda, diante de pessoas de seu grupo. Seu corpo é arrastado e jogado na carroceria de uma camionete. Até o momento não se tem nenhuma notícia do corpo.

Não existe dor maior do que a de não poderem dar sepultamento aos corpos dos entes queridos, para que seu espírito amainado possa estar em paz e restabelecer a tranqüilidade na comunidade. Enquanto isso não acontecer todos os membros do grupo ficam em permanente estado de tensão e aflição.  Por isso os familiares de  Rolindo, Arcelino e de Nizio clamam pela localização e entrega  dos corpos para que possam realizar os rituais necessários para  que as comunidades possam  viver em paz.

O cinismo e a impunidade

No caso do corpo de Nisio, sequestrado e ocultado há cinco dias (no Brasil ou no Paraguai), a Policia Federal afirma que “o suposto corpo ainda não foi encontrado e o caso tratado como desaparecimento pela Polícia Federal, que investiga o ataque. (Midiamax, 23 de novembro)”.

Com relação à morte e ocultamento de corpo de Rolindo Vera e a sugestão da Polícia Federal de arquivamento do processo por falta de provas, assim se expressa o procurador da República em Ponta Porá, Thiago dos Santos Luz – que aproveita para criticar o trabalho da Polícia em relação ao caso:

“É intrigante constatar que pelo menos seis indígenas, as únicas testemunhas oculares dos fatos, em depoimentos detalhados, verossímeis e harmônicos, prestados logo após os crimes, tenham expressamente nominado e reconhecido três indivíduos que participaram direta e pessoalmente do violento ataque a Ypo´i e nenhuma delas tenha sido sequer indiciada pela autoridade policial, que concluiu o caso sugerindo o arquivamento. Pergunto-me: quantos testemunhos mais seriam necessários? Depoimentos de índios não valem nada?”, diz.

No dia 14 de outubro, lideranças indígenas, após ritual e denúncia diante da sede do Ministério Público em Ponta Porã, seguiram, juntamente com o procurador Thiago dos Santos Luz, para entregar a denúncia na Justiça Federal e na Polícia Federal. Infelizmente passado mais de um mês, a Justiça Federal não se manifestou a respeito do pedido do indiciamento dos seis acusados e da reabertura do inquérito.

Muitos boatos, acusações e intimidações correm na região. A Polícia Federal se refere aos fatos como havendo apenas um “desaparecimento”, utilização exclusiva de balas de borracha. Há pessoas que chegam ao absurdo de dizer que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) estaria escondendo Nísio. Outros afirmam que nada sabem e nada aconteceu no município de Aral Moreira, no Guaiviry.

Fonte: Cimi Regional Mato Grosso do Sul
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