Lideranças de Altamira recorrem ao Relator Especial dos Direitos Indígenas da ONU
Carta enviada a James Anaya pede apoio e intervenção do relator na defesa das comunidades indígenas ameaçadas por Belo Monte
Altamira, 20 de julho de 2011
James Anaya
Special Rapporteur of Indigenous Rights from the UN No. (520) 621-9140
Fax
Estimado senhor Anaya,
Vimos através desta, em nome das comunidades indígenas Arara e Juruna da Volta Grande do Xingu a serem afetadas diretamente pelo UHE Belo Monte, pedir respeitosamente seu apoio e intervenção nesta luta.
Como já deve ser do seu conhecimento, o Governo brasileiro não quer respeitar as medidas cautelares (MC-382-10[1]) solicitadas no dia 01 de Abril de 2011 pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), com o objetivo de garantir os nossos direitos como povos indígenas – incluindo grupos que vivem em isolamento voluntário – ameaçados pela construção do Complexo Hidrelétrico de Belo Monte no Estado do Pará. As medidas diziam claramente que o Processo de consulta deveria ser livre, prévio e informado; no entanto, além de não termos sido consultados anteriormente, o Estado não tem feito absolutamente nada para mudar este quadro. Assim, a situação atual encontra-se no mesmo estágio em que estava antes das medidas: não temos informações adequadas sobre o caso e nem fomos consultados a respeito. Somos atingidos diretamente pela barragem e não queremos Belo Monte!
Agora com a recente aprovação da Licença de Instalação em 1º de junho, o projeto teve autorização para iniciar todas as obras de construção. Com isso, o governo deixa claro que não fará nenhuma consulta conosco. Por isso, lhe pedimos que intervenhas em nosso favor. Temos certeza de que com o seu bom senso e profissionalismo podes fazer uma interferência favorável e positiva. Indigna-nos saber que o IBAMA, diante de todas as discussões e dúvidas que envolvem Belo Monte, por ele mesmo reconhecidas, tenha liberado a Licença de Instalação neste preciso momento, mesmo com o pedido de medidas da CIDH. Isso demonstra claramente a covardia e má fé do governo brasileiro, que tantas vezes se diz humanista, mais não respeita o seu próprio povo.
Nosso povo esta cansado de assistir o sofrimento das crianças que nos perguntam “para onde iremos”, com a sensação de que possivelmente perderemos o que temos de mais valioso em nossas vidas; tendo que assistir a morte do Rio Xingu nessa luta injusta, tão somente porque o Governo é incapaz de dialogar com franqueza e repensar um projeto inviável inclusive financeiramente. Portanto, vamos sim lutar até o fim para que a UHE Belo Monte não seja implementada.
O Brasil deveria levar em consideração seu papel como líder global considerando os desafios de um desenvolvimento sustentável, incluindo sua posição de país anfitrião da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio +20) em 2012. Nós acreditamos fortemente que a recusa do Governo Federal em considerar as recomendações da CIDH – como sugerido nas declarações do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) – compromete seriamente não só os direitos e bem-estar dos povos indígenas na Bacia do Xingu, mas também a imagem do Brasil a nível global como um país comprometido com o multilateralismo e suas instituições, tais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Em nome de um país que pode ser ainda um espelho e exemplo de desenvolvimento sustentável; em nome das comunidades indígenas e não indígenas que sofrem por projetos destruidores como o de Belo Monte; e mais que tudo, em nome da justiça que deve prevalecer no mundo; esperamos que o senhor possa levar nossa mensagem adiante, somando-se à esta luta.
Apreciamos muitíssimo sua atenção a este assunto de suma importância e urgência. Gostaríamos de convidá-lo a conhecer nossas aldeias na região da Volta Grande do Xingu e a situação que os povos indígenas estão vivendo diante da ameaça de construção de Belo Monte. Aguardamos atentamente por sua resposta.
Atenciosamente,
Liderança Josinei Arara
Liderança Marino Juruna
Liderança Josiel Jacinto Juruna
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[1] CIDH, PM-382-10, 1 de abril de 2011, Comunidades Indígenas da Bacia do Rio Xingu, Stado do Pará, Brasil.