13/06/2011

Mais um guarani santamariense

Mais um brasileiro

 

Na gélida noite de ontem, 9 de junho, perto da 19h30, sem luz, sem água, sem parteira, embaixo da lona preta, veio ao mundo mais um brasileiro, mais um santamariense, da etnia Mbyá-Guarani. O neófito, ainda sem nome, veio com a tosse e por causa dela, herança de uma provável pneumonia da mãe, legado nosso. Não pôde esperar o Estado, sua mãe só teria uma consulta no dia seguinte. Nasceu com frio, aparado por sua tia. De quente, as lágrimas de sua mãe.

 

Marcelino Martins e Suzana Benites, os pais, felizes e tristes ao mesmo tempo: a tradição do Povo manteria seu curso, mas na miséria deles, vislumbram um futuro sombrio para seu filho. Marcelino pensa isso enquanto fuma em silêncio o tabaco no petynguá, junto com seu cunhado o cacique Mariano Benites.

 

Eles têm muito a oferecer, sua cultura, sabedoria milenar, seus nomes nas coisas, coisas com seus nomes. Mas não tem as coisas mínimas para sobreviver. Dos brancos, herdou a alcunha dos césares, na prática, um monte de inutilidades, nada mais. Ganharam o Dia do Índio, mas esqueceram do respeito.

 

Sua Comunidade vive às margens da BR-392, em cima do barranco. “Não tem terra!” vociferam os não indígenas, onde todos sabem que tem. As autoridades não se entendem nas “competências”, onde o que impera é a incompetência. Luz? “Não pode!”. Mas a rede passa em cima do Acampamento… “Não pode! DNIT não deixa!”. Água? “Vamos ver, hora dessas, quem sabe…”.

 

E o tempo vai passando. Aqui, neste acampamento, estão a cerca de vinte anos. Nessa cidade, antes dela, que ajudaram a levantar. Em 1809, Santa Maria da Boca do Monte (ainda povoado de Rio Pardo) contava com a população de 150 brancos, 35 escravos e 109 guarani. Lutaram séculos, sofreram um verdadeiro genocídio físico e cultural. Quase foram derrotados.  Hoje, suas crianças falam guarani, seus Karaí (pajés/médicos) conhecem os remédios da natureza, seu povo busca Nhanderú (Deus) na Casa de Reza, não espancam suas crianças, essas, entre si, não praticam o tal do bullying.

 

Marcelino bate o petynguá para limpar as cinzas e coloca mais um pouco de tabaco. Dá uma baforada. Enquanto a fumaça se dissipa no ar, pede para que Nhanderú abra os corações dos brancos para a luz entrar. Para que eles percebam e assumam suas responsabilidades pela invasão do Brasil. Se é que eles ainda têm coração e lembram o que significa responsabilidade…

 

GAPIN – Grupo de Apoio aos Povos Indígenas/SM

 

Fonte: GAPIN - Grupo de Apoio aos Povos Indígenas/SM
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