30/05/2011

Entidades repudiam proposta de retirada Xavante de terra tradicional pela segunda vez

Manifesto

 

As entidades que assinam este manifesto vêm a público repudiar a proposta do governo de Mato Grosso que sugere a remoção dos cerca de 700 índios xavante ocupantes da Terra Indígena Marãiwatsédé, em Alto Boa Vista, no nordeste do estado, para o Parque Estadual do Araguaia, no município de Novo Santo Antônio. O que o governador Silval Barbosa chama de “solução pacífica” é uma proposta duplamente inconstitucional.

 

Ela incentiva a saída dos indígenas de seu território tradicional homologado pela União desde 1998. O processo demarcatório, que começou em 1992 e reconheceu esta área como de uso tradicional, leva em conta a história desse povo, os locais de antigos aldeamentos e pontos estratégicos de recursos naturais que permitem sua reprodução física e cultural.

 

Em vez de tomar providências para remover ocupantes ilegais do território indígena, o governo de Mato Grosso sugere retirar mais uma vez os legítimos donos de Marãiwatsédé. Além de não ser local de uso tradicional dos Xavante, o Parque Estadual do Araguaia foi criado para fomentar o turismo ecológico e a conservação da biodiversidade, já havendo inclusive plano de manejo em implantação, pesquisas científicas em andamento e funcionários da Secretaria do Estado de Meio Ambiente lotados no local.

 

O povo Xavante luta pela permanência em seu território tradicional, que tem sido intensamente devastado pela ocupação ilegal de fazendas de soja e pecuária. Hoje, cerca de 85% dos 165 mil hectares da terra indígena estão desmatados e os índios vivem encurralados em cerca de 15 mil hectares que apresentam sérios problemas de escassez de recursos naturais.

 

Diante disso, as entidades repudiam a proposta do governador Silval Barbosa, sustentada por deputados estaduais liderados por José Riva, além do deputado federal Wellington Fagundes e os senadores Blairo Maggi e Jaime Campos, e condenam a formação de um grupo de trabalho no âmbito do Ministério da Justiça já que desde outubro de 2010 existe uma decisão do Tribunal Regional Federal determinando a retirada dos ocupantes não-indígenas.

 

Primeira retirada forçada

 

Nos anos 60, colonizadores liderados por Ariosto da Riva invadiram o território Xavante instalando um latifúndio de 1 milhão de hectares conhecido como Suiá-Missu, nome do rio que corta a área e deságua no Xingu. Para permitir a ocupação sem a presença dos indígenas, em 1966 foi iniciada a transferência de 250 xavante para a Missão Salesiana em São Marcos, a 400 km ao sul de Marãiwatsédé. A ação foi executada pela Força Aérea Brasileira (FAB) e pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão que antecedeu a criação da Fundação Nacional do Índio (Funai).

 

Depoimentos de índios mais velhos apontam que essa transferência, que provocou diretamente a morte de pelo menos 90 pessoas, representou uma violenta ruptura. Em 1992 os ocupantes ilegais de Marãiwatsédé comprometeram-se verbalmente a devolver a área ao povo xavante, após pressões internacionais na área ambiental. A resposta a este acordo foi a invasão estimulada por políticos de Mato Grosso e fazendeiros da região, mesmo sabendo que a área estava em processo de regularização, concluído em 1998, ano em que foi finalmente homologada. Esse foi o período de maior devastação no interior da terra indígena, hoje conhecida como a mais desmatada da Amazônia brasileira.

 

Em 2004, após 10 meses acampados à beira da BR-158 à espera de uma decisão judicial, quando muitos indígenas adoeceram e pelo menos 3 crianças morreram, os Xavante conseguiram retomar parte do território. Os indígenas que vivem na aldeia hoje estão sob permanente clima de tensão e ameaça.

 

Últimos acontecimentos

 

No dia 9 de maio de 2011, cerca de 100 guerreiros Xavante retomaram a sede da Fazenda Velho Oeste, dentro da TI Marãiwatsédé porque descobriram que uma área de 900 hectares estava sendo negociada para venda. Armas e munições foram encontradas pelos índios na propriedade. Os Xavante exigiram a presença da equipe do Incra para a realização do levantamento fundiário, que já está na região.

 

No último dia 16, o Ministério Público Federal entrou com um pedido de execução de sentença para que a Justiça intime todos os ocupantes não-índios de Marãiwatsédé a sair da terra indígena em 30 dias. A solicitação se baseia na decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), de outubro de 2010, que determinou a saída dos posseiros, sem chance de recurso.

 

No dia 20 de maio, a Funai publicou uma nota oficial dizendo que a proposta do governo do estado de Mato Grosso não encontra respaldo legal. A instituição federal garante a retirada dos invasores da TI Marãiwatsédé, a posse plena da terra aos indígenas e ações de recuperação ambiental da área para que seja ocupada pelos Xavante segundo seus usos, costumes e tradições, como determina a Constituição. Assegura também o reassentamento dos ocupantes não indígenas situados na área da terra indígena e que atendam ao perfil de cliente da reforma agrária, para a pacificação de possíveis conflitos na região.

 

Sendo assim, as entidades abaixo-assinadas repudiam a proposta inconstitucional levada ao Ministério da Justiça pelo governador de Mato Grosso:

 

ABONG – Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais

ARPA – Associação Rondopolitana de Proteção Ambiental

Cimi – Conselho Indigenista Missionário

ABHP – Associação Brasileira de Homeopatia Popular

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

IC – Instituto Caracol

GPEA – Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte

REMTEA – Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental

AXA – Articulação Araguaia Xingu

REMSOL – Rede Matogrossense de Educação e Socioeconomia Solidária Revista Sina

FLEC- Fórum de Lutas das Entidades de Cáceres

OPRIMT – Organização dos Professores Indígenas do Mato Grosso

CEEIMT- Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena

 

Fonte: Abong
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