10/02/2011

Informe nº 950: Movimento guarani no sul do país se fortalece e discute demandas em Encontro

Cerca de 300 pessoas participaram, entre 4 e 7 de fevereiro, do Encontro de Lideranças Guarani e do Conselho de Articulação do Povo Guarani no Rio Grande do Sul. Foram 200 indígenas e mais 100 outros participantes entre simpatizantes da causa, movimentos sociais e grupos de apoio.

A situação fundiária, a reestruturação da Funai e o atendimento à saúde indígena foram os pontos mais preocupantes e que receberam maior destaque na reunião. Sobre a situação fundiária, o que mais preocupa é a falta de demarcação – a maioria das terras Guarani no Rio Grande do Sul não é demarcada –, a demarcação em áreas muito pequenas e a permanência de fazendeiros nas áreas indígenas.

Em relação à reestruturação da Funai, os indígenas sentem a falta de diálogo por parte do órgão indigenista oficial, em relação às medidas que vêm sendo tomadas, mudanças. Na saúde, também não há repasse de informações. Os indígenas reclamam da falta de explicações sobre o que muda com a troca da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) no atendimento.

Grandes obras

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) também atinge fortemente os indígenas no sul. Os principais empreendimentos são as duplicações de rodovias, que atingem cerca de dez áreas indígenas, e a construção das pequenas centrais hidrelétricas (PCH’s), que afetam as terras Estrela Velha e Salto do Jacuí.

Na opinião do vice-presidente do Cimi, Roberto Liebgott, dos encontros que participou, este foi o que percebeu maior participação nos debates. “Percebi grande interesse dos indígenas das discussões, e nos encaminhamentos das ações. Acredito que existe um fortalecimento cada vez maior do movimento indígena guarani no sul, principalmente em torno do Conselho de Articulação do Povo Guarani”, afirmou.

Veja abaixo o documento final do encontro.

Documento Final: Encontro de Lideranças Guarani e do Conselho de Articulação do Povo Guarani no Rio Grande do Sul

As lideranças de 23 aldeias Guarani do Rio Grande do Sul se reuniram juntamente com o Conselho de Articulação do Povo Guarani – CAPG/RS, nos dias 4 a 7 de fevereiro de 2011, no município de São Gabriel. Nesta data nós lembramos o massacre de milhares de nossos parentes e da morte Sepé Tiaraju praticados por soldados espanhóis e portugueses, no ano de 1756. Lá nossos Karaí e Kunhã karaí (líderes religiosos) rezaram a Ñhanderu pelos parentes que morreram lutando por nossa terra.

No encontro discutimos várias questões que preocupam nossas comunidades, como a demarcação de nossas terras, as mudanças na gestão do atendimento à saúde indígena, a reestruturação da FUNAI, os impactos de grandes empreendimentos sobre nossas terras e comunidades a exemplo das duplicações das BRs 116 e 290, a educação diferenciada em nossas aldeias, e as políticas de apoio à agricultura e sustentabilidade às nossas famílias.

Em todas estas questões, após avaliarmos a situação de nossas aldeias, sentimos que ainda falta muito para garantir nossos direitos definidos pela Constituição Federal, pelos tratados internacionais e leis direcionadas aos povos indígenas. O principal atraso continua sendo a demarcação de nossas terras. Vivenciamos desde processos já concluídos no papel, mas que as aldeias continuam com problemas porque a Funai não retira os ocupantes das nossas terras, até realidades em que as famílias estão em situações muito precárias, obrigadas a morar em barracos de lonas, acampadas em beira de estradas. E, além disso, sempre somos ameaçados de despejo por empreendimentos de desenvolvimento da economia não indígena. Isso tudo porque o governo não demarca as nossas terras.

E isso tudo acontece para nosso povo que antes tinha um grande território, mas que foi transformado em cidades e nos estados das regiões sul, sudeste e centro oeste do Brasil, e nos países da Argentina, Paraguai, Bolívia e Uruguai. Dividiram o território e dele nos expulsaram. Hoje estamos apertados pelas cidades e fazendas em todos os lugares. Essa situação nos causa muita tristeza.

Estamos cansados de viver na beira das estradas. Estamos cansados de ver nossas crianças, nossas mulheres, nossos velhos arriscarem a vida para buscar água, para lavar roupa, para vender o artesanato nos acostamentos das rodovias. Estamos cansados de viver sem a nossa terra. Exigimos respeito. Dissemos isso aos representantes da Funai, da Funasa e da Secretaria da Atenção Especial à Saúde.

Em resumo, necessitamos e exigimos rapidez no reconhecimento e demarcação de nossas terras e no atendimento de políticas diferenciadas em saúde, educação. Exigimos também que as propostas que pretendem elaborar, sobre as políticas para o nosso povo, sejam, antes de tudo, discutidas com nossas comunidades e lideranças. Não vamos mais aceitar e esperar calados, porque é nosso direito participar das decisões que nos dizem respeito.

Apesar de tudo isso, temos esperanças que os não indígenas reconheçam a gravidade de nossos problemas e os poderes públicos cumpram com suas responsabilidades. Nossos Karaí e as nossas Kunhã Karaí nos alertam e nos orientam para que a gente se articule cada vez mais e cobre das autoridades que as leis, que os brancos criaram, sejam respeitadas e cumpridas.

São Gabriel, 7 de fevereiro de 2011. 

Fonte: Cimi
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