08/02/2011

Seminário na UnB discute problemas do projeto Belo Monte para a população local e povos indígenas

Por Maíra Heinen

Assessoria de Comunicação do Cimi

 

Não faltaram razões para não se construir a Usina Hidrelétrica de Belo Monte durante as exposições do Seminário sobre a hidrelétrica de Belo Monte e a Questão Indígena, realizado ontem (7), no auditório Darcy Ribeiro, da Universidade de Brasília (UnB). O seminário, promovido pela Associação Brasileira de Antropologia (ABA), contou com a participação de diversas lideranças indígenas, além de ribeirinhos, agricultores, pescadores e outros moradores da região do Xingu. Também participaram representantes do governo e a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, além de antropólogos, estudantes da UnB e integrantes de movimentos sociais como Cimi, MAB, Movimento Xingu Vivo Para Sempre.

 

Durante a manhã houve uma mesa de abertura dos trabalhos e logo foram apresentadas as perspectivas sobre a obra, na visão dos indígenas, ribeirinhos e movimentos sociais que atuam na região. Um dos pontos mais comentados se resume na fala de Gustavo Lins Ribeiro, antropólogo e professor da UnB, que ressaltou em Belo Monte uma concepção de desenvolvimento completamente equivocada. “Não inclui estruturas locais nos benefícios e os prejuízos só ficam com os moradores da região. Quando se trata de investir no bem estar das populações, os recursos são infinitamente menores”, afirmou. Para Ribeiro, a obra não pode acontecer. “Desejo que Belo Monte não seja construída para não destruir povos e florestas na Amazônia”, declarou.

 

A emblemática liderança Raoni Metyktire, cacique Kayapó, declarou que não quer Belo Monte e que é contra porque os indígenas sempre foram muito enganados. “Sempre prometem dinheiro, prometem coisas e nós índios, fomos enganados! Eu vou lutar por minha área, porque quero que fique para meus netos!”, disse. Na mesma linha seguiu Megaron Txucarramãe, que afirmou: “Mesmo que a Eletronorte ou a Dilma encha essa sala de dinheiro, eu não vou aceitar Belo Monte, porque o dinheiro não paga o lugar que será inundado, porque será inundado para sempre e isso eu não quero! Vou sempre falar não, não e não! Essa é a nossa posição!”, afirmou.

 

Para outros, construção de Belo Monte é um chamado para guerra. Ozimar Juruna, afirmou que seu povo não deixará o rio se acabar. “O Xingu é nosso sangue e a floresta é o ar que respiramos! A luta continua e nós não vamos desistir!”. Josinei Arara afirmou também que o governo não conhece a realidade dos povos do Xingu e que a usina vai prejudicar muito toda a vida desse povo. “O governo nos apunhalou pelas costas, fez papel de moleque e não assumiu a sua responsabilidade!”, finalizou.

 

Representando os ribeirinhos e agricultores falaram Antônia Melo e Ana Alice Santos, do Movimento Xingu Vivo Para Sempre. Melo fez um pequeno relato histórico do que vem acontecendo em relação à construção desta usina no Pará. “Na época da ditadura o governo já queria implantar Kararaô e não conseguiu. Agora o projeto volta maquiado de inverdades para que a gente o aceite!”, lembrou. Depois de lembrar que as denúncias do MPF e das sucessivas vitórias do governo em cima de liminares, ela ressaltou que a única força é o próprio povo. “Não tem coisa que o governo tenha mais medo do que o povo nas ruas revoltado!”. Ana Alice, no mesmo sentido, afirmou que Belo Monte é um rolo compressor. “Somos o tempo todo ameaçados por empresários que só querem trazer miséria. Pra quê indenização? Para onde eu vou? Nenhum agricultor foi ouvido, nenhum pescador foi ouvido e nem mesmo os empreendedores não sabem o que vai acontecer lá!”, declarou.

 

Os dilemas de um grande projeto

 

No segundo momento do seminário, foram discutidos os problemas do projeto entre antropólogos, o MPF, representantes do governo e dos movimentos. As professoras Sônia Magalhães e Andréa Zhouri mostraram as falhas do projeto e os grandes impactos da obra na vida das populações locais. “Grandes obras entram em colisão com as culturas tradicionais, então, na visão das empresas, as pessoas é que precisam se adequar à obra e não o contrário e aqui surgem as medidas mitigadoras”, afirmou Andréa. Para as pesquisadoras, o grande resultado da problemática é uma crise na democracia, a crise das instituições e o risco à existência da vida dos povos indígenas, com a desqualificação dos discursos dos povos locais.

 

Já a vice-procuradora geral da República, Débora Duprat, criticou o empreendimento por não contemplar um estudo de impacto ambiental que trate do componente humano. “Quando foram inauguradas as audiências públicas, não havia um estudo de impacto ambiental porque não havia um estudo sério e consistente sobre o meio antrópico. Isso é uma farsa de todo o processo democrático que inspira o processo de licenciamento”, afirmou. Duprat também criticou o fato de usinas serem consideradas fontes de energia limpa. “Como é que pode ser limpo um empreendimento que provoca degredo, fim de relações de compadrio, fim de relações de amizade e desestrutura culturalmente um grupo? Considerar isso uma energia limpa é considerar o meio ambiente absolutamente dissociado das pessoas”, finalizou.

 

Moisés Ribeiro, integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), iniciou sua fala questionando: “Belo Monte para quê e para quem?”. Ele afirmou que a obra não serve em nada para os moradores da região. “Belo Monte é um projeto do grande capital e a posição do MAB é ser radicalmente contra esse projeto e outra série de barragens projetadas”, informou. Moises também lembrou que é importante discutir o modelo energético adotado no Brasil como um todo.

 

A fala do governo

 

Como representantes do governo no seminário estavam Paulo Maldos, da Secretaria Geral da Presidência da República e o deputado Domingos Dutra, do PT do Maranhão. Maldos informou que a sua função enquanto governo era de implementar o diálogo, e que vinha dialogando bastante com os movimentos. “Escutando as análises, vejo um quadro bastante preocupante”, afirmou. Ele também propôs a composição de uma agenda de movimentos, com os temas importantes e preocupantes para que se abra esse diálogo com o governo, podendo assim criar um novo modelo de desenvolvimento.

 

Já Domingo Dutra exigiu que o governo pague a dívida histórica de décadas das hidrelétricas para com as populações ribeirinhas. “É preciso colocar isso na agenda, pois o maior filé do capitalismo brasileiro é a construção de hidrelétricas”, declarou. Dutra deu vários exemplos de hidrelétricas e os problemas que acarretaram para o povo local. “Não pagam as indenizações, as atribuições do poder público são passadas para a iniciativa privada que não está nem aí para o povo!”. Ao final, o deputado afirmou que é preciso fazer muita pressão para que pelo menos as condicionantes sejam cumpridas.

Fonte: Cimi
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