09/11/2010

10ª Assembléia da Organização Oro Warí

Por Equipe Guajará Mirim/Cimi Regional Rondônia

 

Encontro, que aconteceu na cidade de Guajará Mirim, foi marcada pelo descontentamento dos participantes diante dos descasos da Funasa e da Funai

 

Entre os dias 26 e 28 de outubro deste ano foi realizada a 10ª Assembléia da Organização Oro Warí, que reúne 24 povos dos municípios de Guajará Mirim e Nova Mamoré, em Rondônia. O evento aconteceu no Centro de Treinamento São José, em Guajará Mirim. Cerca de 120 pessoas participaram do encontro, entre lideranças indígenas, caciques, agentes de saúde indígena, professores e conselheiros. Durante o evento houve forte presença e participação das mulheres, dentre as quais a coordenadora da Coordenação da União dos Povos Indígenas de Rondônia, noroeste do Mato Grosso e sul do Amazonas (Cumpir), Eva Canoé.

 

Em sua fala, Canoé destacou a preocupação com a forma com que o governo vem tratando os povos indígenas do país, principalmente no que diz respeito à implantação dos grandes projetos na Amazônia, em especial em Rondônia com a construção de usinas no rio Madeira e outras pequenas centrais hidrelétricas no interior do estado. De acordo com a coordenadora, todas essas obras estão sem implantadas nas proximidades ou mesmo dentro dos territórios indígenas, sem que estes sejam consultados, como lhes assegura a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e outros documentos nacionais e internacionais.

 

A principal reivindicação da organização e de todos os povos indígenas do estado é a implantação de políticas públicas nas áreas de saúde, educação e saneamento básico, entre outras. Atualmente, a situação mais urgente se refere à precariedade no atendimento à saúde, com o registro de diversas mortes nos últimos anos. Diversas denúncias já foram encaminhas pelas comunidades do estado, mas até o momento os órgãos competentes não apontaram uma solução para o problema.

 

Na região está localizado um dos mais problemas relacionados à falta de atendimento à saúde. O Pólo Base depende diretamente do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) de Porto Velho, com sede distante cerca de 380 quilômetros de Guajará Mirim. O Distrito nem sequer atende a todas as reivindicações dos povos do estado ou daqueles representados pelo Conselho Local de Saúde Indígena.

 

Dentre os principais problemas enfrentados na região estão a falta de transporte de emergência para transportar os doentes das aldeias para a Casa de Saúde Indígena (Casai), capacitação e contratação de Agentes Indígenas de Saúde (AIS), construção de postos de saúde nas aldeias, ampliação da Casai, aquisição de medicamentos e equipamentos. De acordo com relatos dos participantes, essas melhorias têm sido solicitadas desde 2000, mas até o momento nenhuma foi atendida. Outro agravante á saúde dos povos de Rondônia é o alto índice das hepatites B e C, cujos portadores não vêm tendo acompanhamento e tratamento adequados, o que levou, inclusive, duas pessoas a morte nos últimos três anos.

 

Sesai

 

As discussões giraram em torno da conjuntura da política indigenista, que hoje passa por mudanças sérias em todos os órgãos, com as implantações da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e dos Territórios Étnicos Educacionais, além da reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e das questões conflitivas em relação a construção de hidrelétricas e outras grandes obras que afetam diretamente comunidades indígenas.

 

Os povos exigem participação em todos esses processos ou ao menos o direito de serem consultados, o que não vem acontecendo a exemplo de uma portaria municipal para realização de teste seletivo para contratação dos servidores de saúde que atuarão nas áreas indígenas. Este assunto foi polêmico, pois o município elaborou um edital sem ao menos consultar a organização ou o Conselho Local, que há meses não se reúne, pois o DSEI alega falta de recursos.

 

Durante o encontro, também foi questionado o número e o nome dos servidores que são contratados com recursos do SAS proveniente do Ministério da Saúde via município. Os participantes foram pegos de surpresa ao descobrirem o nome de uma enfermeira que recebe parte deste recurso, mas não trabalha no Pólo Base de Guajará Mirim. De acordo com o prefeito do município, Atalíbio José Pegorini, o caso já estaria sendo resolvido. A liderança Silas Oro Nao’ foi sucinto ao afirmar que com o valor pago a essa enfermeira daria para contratar pelos menos mais sete agentes de saúde para atendimento nas aldeias.

 

Autoritarismo

 

Um dos grandes questionamentos dos povos em relação à implantação da Sesai é quanto à chefia dos Dseis, principalmente o de Porto Velho. Eles querem saber se irão acontecer mudanças ou se as mesmas pessoas continuaram à frente dos trabalhos. Para

os participantes, a real preocupação é que os Dseis continuem chefiados com base no autoritarismo e no jogo de interesses e não nas necessidades dos indígenas do país. De acordo com eles, atualmente todas as decisões são tomadas a revelia dos conselhos locais de saúde indígena. “Nós do movimento não podemos deixar isso acontecer”, salientou Milton Oro Não’, coordenador da Organização Oro Wari.

 

Educação

 

Em relação à educação foi refletido sobre a formação dos Territórios Étnicos Educacionais, este ainda muito obscuro para as comunidades e lideranças indígenas. Também se discutiu sobre o concurso específico e diferenciado para os professores indígenas: como vai acontecer e qual o papel da comunidade neste processo. “Educação é um bom caminho a ser seguido, mas não podemos jogar toda responsabilidade para o professor. Essa lei não é conquista dos políticos e sim de nós lideranças. Nós indígenas, assim como os “brancos”, temos que dá prioridade à educação. O professor tem que estar unido à comunidade, assim como a comunidade ao professor”, declarou Arão Oro Waram Xijein, importante liderança local e ex-coordenador da Opiron.

 

Reestruturação da FUNAI

 

O debate sobre a Funai foi bastante polêmico e tenso. Faz cinco anos que o movimento indígena local pede mudanças no quadro de servidores da Fundação. Nestes anos aconteceram vários manifestos exigindo essas mudanças, como a ocupação do prédio da Funai, a apreensão de veículo numa aldeia, um ato público nas ruas, diversas reuniões com políticos e com o presidente do órgão, bem como denuncias ao Ministério Publico Federal (MPF).

 

O movimento afirma que a reestruturação da Funai na Coordenação de Guajará-Mirim deve passar principalmente por uma reestruturação no quadro dos servidores, em especial aqueles que há anos vêm discriminando e desrespeitando os povos indígenas. Depois de muita pressão, Joel Oro Nao’, atual coordenador da FUNAI na região, afirmou que atenderá as solicitações das comunidades indígenas.

 

“É muito fácil pedir pra esquecer o passado, o difícil é esquecer. Mesmo com a troca de funcionários, tudo que se passou até agora com nossos parentes não tem como esquecer, vai ficar guardado na memória de cada um, as violências sofridas por essas pessoas”, desabafou após a promessa de Joel, Valdito Oro Eo, cacique da aldeia Lage Velho, na Terra Indígena Lage.

 

Embora com muito esforço da coordenação da Organização em manter a calma dos participantes, a assembléia foi encerrada num clima tenso diante da indignação das lideranças frente aos descasos que sofrem pelos órgãos que foram criados para atender aos povos indígenas.

 

Oro Warí

 

A Organização Oro Warí, abrange 24 povos indígenas da região de Guajará Mirim e Nova Mamoré, sendo o povo Oro Warí o mais numeroso de todo o estado, com aproximadamente 3.800 pessoas. Hoje, a população indígena da região ultrapassa os 5.500, o que chega a ser a metade da população indígena do estado de Rondônia.

Fonte: Cimi Regional Rondônia
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