Usina de Jirau: MPs movem ação civil pública para garantir direitos
Pressa na retirada de moradores tem causado violação dos direitos constitucionais
Direitos fundamentais como saúde, educação, segurança e moradia digna estão sendo desrespeitados pelo poder público e pela empresa construtora da usina hidrelétrica de Jirau. Isto é o que afirmam os Ministérios Públicos Federal e Estadual de Rondônia, que ingressaram na Justiça Federal com uma ação civil pública contra a União, o Ibama, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), consórcio ESBR (Energia Sustentável do Brasil S/A), prefeitura de Porto Velho e governo de Rondônia.
A usina de Jirau, no rio Madeira, inundará o distrito de Mutum Paraná, distante
Para reassentar as famílias, um complexo residencial chamado de Nova Mutum foi instalado a
Indenizações
Segundo os MPs, a situação dos moradores que permaneceram
A Licença de Instalação nº 621/2009, concedida pelo Ibama, estabeleceu que a ESBR deveria apresentar à população atingida um caderno de preços utilizado para fundamentar as indenizações, além de assistência técnica, jurídica e social. No distrito, os habitantes contam que nunca receberam este caderno de preços. Os MPs afirmam que até o contato dos moradores com a ESBR ficou dificultado porque “o escritório da empresa encontra-se, literalmente, com as portas fechadas para a população atingida”.
Sem luz e sem segurança
Um morador afirmou ao MP que “a Energia Sustentável do Brasil está intimidando a população a aceitar as propostas oferecidas pelo consórcio ao dizer que vão retirar o gerador de energia, transferir o posto de saúde e a escola, além de retirar o policiamento”.
Saúde
A única unidade de saúde ainda existente
Mutum Paraná tem apenas uma ambulância, que está parada por falta de manutenção mecânica. Em busca de atendimento médico, a população tem que se deslocar até outro distrito – Jacy-Paraná – ou à sede de Porto Velho, por conta própria.
Segundo os MPs, a prefeitura de Porto Velho deveria fiscalizar e exigir da ESBR todas as condições necessárias ao atendimento adequado. “A omissão e ineficiência do serviço de saúde pública prestado aos moradores é um grave atentado ao direito à vida previsto na Constituição Federal”, afirmam.
Educação
A única escola mantida pela prefeitura foi desativada e transferida para Nova Mutum, obrigando crianças e adolescentes de Mutum Paraná a percorrerem diariamente
Durante a visita de representantes do Ministério Público à Mutum Paraná, um grupo de alunos aguardou o ônibus escolar por mais de uma hora. Expostos ao sol de meio dia e cansados de esperar, acabaram voltando para suas casas. Os estudantes relataram que isto ocorre com freqüência.
Nova Mutum, antigos problemas
O projeto residencial denominado de Nova Mutum prevê a construção de 1,5 mil casas, destinadas em parte aos moradores de Mutum Paraná e em outra parte ao alojamento para funcionários da ESBR. Embora seja uma das poucas áreas do Estado de Rondônia que está tendo a oportunidade de ser planejada, a nova vila tem apresentado até o momento os mesmos problemas da antiga Mutum.
Segundo os MPs, pela “pressa” em realocar as famílias, o consórcio mudou diversas famílias para a Nova Mutum sem completar a infraestrutura necessária. A vila não tem serviços públicos básicos em funcionamento, como posto de saúde, áreas de lazer (praças), comércios, terminal rodoviário, posto de policiamento fixo e permanente.
Na localidade, a estrutura comercial ainda não está efetivamente construída. As famílias que sobreviviam de pequenos comércios (bares, na maioria) estão sendo obrigadas a improvisarem os estabelecimentos em suas próprias casas. Aliado a isto, o consumo de bebidas alcoólicas por moradores da vila e trabalhadores da usina, incluindo-se menores de idade, tem agravado a prostituição, inclusive infantil, naquele local.
Segundo os MPs, o terminal de ônibus prometido pela ESBR não está concluído e quem precisa do transporte coletivo tem que se deslocar até a BR-364, gerando riscos para idosos, portadores de necessidades especiais e crianças.
“Se há urgência na remoção das famílias da área a ser atingida pela construção da usina, o ônus deve recair sobre a construtora e nunca contra os afetados pelo empreendimento”, argumentam os MPs.
Irregularidades
O processo de loteamento de Nova Mutum ainda tem pendências e está em trâmite na Secretaria Municipal de Regularização Fundiária (Semur). Mesmo assim, a prefeitura de Porto Velho permitiu que a ESBR iniciasse as obras e manteve-se inerte ao processo de remanejamento das famílias atingidas pela usina de Jirau.
Outra irregularidade apontada pelos MPs é que a prefeitura de Porto Velho ainda não concedeu a autorização chamada de ‘Habite-se’, espécie de certidão que autoriza o imóvel recém-construído a ser ocupado e serve de garantia de que a construção seguiu corretamente tudo o que estava previsto no projeto aprovado.
Liminar
Os MPs pedem à Justiça Federal uma decisão liminar que obrigue os réus a cumprir suas obrigações, sob pena de multa diária de cem mil reais para cada item descumprido.
Os órgãos querem que o governo estadual aumente o número de policiais
A prefeitura de Porto Velho terá que normalizar o atendimento no posto de saúde de Mutum Paraná e exigir da ESBR a construção e o funcionamento da unidade na Nova Mutum, além de colocar ambulâncias para as duas vilas, sem que haja prejuízo ao atendimento
O município também deverá reativar a escola e os serviços municipais
Os MPs também pedem, em caráter liminar, que a Justiça Federal determine a ESBR não realoque mais nenhuma família enquanto não forem concluídas as obras de infraestrutura, devendo aplicar e respeitar integralmente o plano urbanístico apresentado às autoridades públicas da União, do Estado de Rondônia e do Município de Porto Velho.
A empresa ESBR também deve disponibilizar e manter postos de atendimento social aos moradores, prestando informações sobre o processo de remanejamento, fornecer toda a documentação pertinente ao empreendimento, em especial, cadernos de avaliação de preços, laudos de avaliações de cada imóvel, com valores individualizados referente a cada item, metodologia empregada, coordenadas das áreas que serão inundadas e APP’s remanescentes, bem como quaisquer outros documentos.
Os MPs querem também que a União e a Aneel sejam obrigadas a fiscalizar as cláusulas do contrato de concessão da usina de Jirau. Assinaram a ação civil pública o procurador da República Ercias Rodrigues e os promotores de Justiça Edna Capeli, Aidee Torquato, Aluildo Leite, Emília Oiye, Pedro Wagner Pereira Júnior e Tânia Santiago.