13/08/2010

Jovens indígenas exercem sua participação em oficina promovida em Cuiabá (MT)

Karine Alves, 18 anos, é indígena da etnia Guató, do Mato Grosso, e professora na aldeia Aterradinho, localizada no município de Barão de Melgaço, região sul do estado. Ministra aulas de 1ª a 4ª série, numa sala anexa da Escola Estadual Antônio João Ribeiro. “A escola não é indígena. Existe um plano para a construção da escola indígena, mas como a terra ainda não foi demarcada, não temos nossa escola”, lamenta.

 

A reivindicação por uma escola diferenciada e de qualidade nas aldeias foi apontada por ela e também por outros 15 jovens presentes à segunda etapa do ciclo de oficinas voltadas a discutir os direitos e as políticas para as crianças e os adolescentes indígenas. A oficina ocorreu de 9 a 11 de agosto, em Cuiabá, e contou com a presença de 40 participantes indígenas entre professores, mulheres, lideranças e estudantes dos estados de Tocantins e Mato Grosso.

 

“É importante o jovem indígena participar desses espaços porque vai mudando a sua mentalidade e acumulando conhecimento. A oficina foi um meio de conhecer os problemas de cada etnia e de tentarmos elaborar sugestões conjuntas para solucioná-los”, disse Moraes Cezar, do povo Rikbaktsa, de 21 anos.

 

A participação juvenil indígena vem crescendo nos últimos anos. Tradicionalmente, em grande parte das etnias, as decisões são tomadas pelos mais velhos, pelas lideranças tradicionais, sem muita participação dos mais jovens. Entretanto, como a mobilidade aldeia-cidade, assim como o domínio do português e dos signos não indígenas são mais freqüentes entre os jovens, as lideranças mais velhas estão aprendendo a somar o conhecimento trazido de fora pelos jovens aos saberes tradicionais.

 

Desta forma, ferramentas e conhecimentos técnicos, lingüísticos, acadêmicos etc., que muitas lideranças tradicionais não dominam, são acionados pelos jovens, que passam a conquistar um lugar representativo em suas aldeias. Hoje eles são ouvidos e respeitados em espaços antes restritos a profissionais indígenas e lideranças tradicionais. “Eu atribuo essa mudança ao fato de os jovens indígenas estarem frequentando as universidades. Foi o que aconteceu comigo. Depois de formada fui chamada para participar de uma reunião no Wata (reunião Xavante fechada para homens) para falar de um projeto que estava propondo na minha aldeia”, relatou Ro’otsitsina Xavante, de 24.  

 

Ro’otsitsina, que terminou recentemente o curso de Serviço Social, define esse acontecimento como uma forma de apoio e reconhecimento de sua comunidade ao seu esforço e dedicação. Porém, para ela as mudanças geram rupturas na organização social do povo que precisam ser refletidas e amadurecidas. “Eu acabei não indo à reunião porque ainda não sei como me portar numa situação como essa. Por ter me formado, tenho com o que contribuir, mas meu lugar na comunidade ainda não é claro”.

 

Este é um dos desafios que mais inquietam os jovens indígenas. Muitos jovens têm saído de suas aldeias para cursar a universidade e, quando terminam o curso, se deparam com o dilema de como dar um retorno do que foi apreendido a suas comunidades. Depois de formado, como o jovem se encaixa na estrutura tradicional do povo?”, questiona Ro’otsitsina.

 

Para Tuinaki Karajá, de 21 anos, ingressar na universidade foi uma experiência que, no início, se revelou mais difícil do que ela imaginava. “No começo havia a discriminação dos meus colegas porque sou indígena. Faziam piadas e, às vezes, me olhavam estranho porque estava pintada. Agora eles já se acostumaram. Falta conhecimento sobre os povos indígenas”, relata.

 

Temas como estes continuarão a ser debatidos nas próximas oficinas regionais. De 25 a 27 de agosto, será realizada a etapa da região Norte, em Manaus (AM). As oficinas são parte do projeto “Formulação de políticas para crianças e adolescentes indígenas e capacitação dos operadores do Sistema de Garantia de Direitos”, uma parceria entre o Centro Indígena de Estudos e Pesquisas (Cinep), a Secretaria de Direitos Humanos (SDH/PR) e o Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes (Conanda).

 

O projeto tem o objetivo de reunir informações sobre as crianças e adolescentes indígenas para formular políticas públicas para esta população e identificar a situação das crianças e adolescentes indígenas em todo o país. Como resultado das oficinas serão

elaboradas diretrizes e propostas para compor o Plano Decenal dos Direitos das Crianças e Adolescentes que contemplem especificidades dos povos indígenas.

Fonte: Cinep
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