08/06/2010

CESP deve custear estudos em sítios arqueológicos em MS

Ação do MPF resultou em determinação judicial para que empresa pague pesquisa por tempo indefinido. Estudos já realizados comprovam ocupação da região de Três Lagoas há pelo menos sete mil anos. 

 

A Companhia Energética de São Paulo (Cesp) foi condenada pela Justiça Federal a manter programa de levantamento, monitoramento e resgate arqueológico na margem sul-mato-grossense dos reservatórios das usinas hidrelétricas Engenheiro Sérgio Motta (Porto Primavera), Engenheiro Souza Dias (Jupiá) e Ilha Solteira, todas no Rio Paraná.

 

Os estudos devem ser mantidos "indefinidamente", até que se esgote a análise de todos os locais de interesse arqueológico atingidos pelas barragens. A empresa pode recorrer da decisão judicial mas os estudos devem recomeçar imediatamente. O MPF já requereu a intimação judicial da Cesp para que comprove a continuidade do monitoramento e resgate.

 

Entenda o caso

 

O processo foi ajuizado pelo Ministério Público Federal (MPF) em Três Lagoas, em novembro de 2005, após estudos iniciais revelarem a riqueza histórica do material recolhido, com amostras que comprovam a ocupação da região há pelo menos sete mil anos. Na inicial da ação, o MPF afirma que o patrimônio histórico nacional está sendo perdido com a erosão provocada pela variação do nível dos reservatórios e a destruição da vegetação nativa das margens. Na época, havia áreas com erosão de 15 metros de largura.

 

Para o procurador da República, Leonardo Augusto Guelfi, "o que está em discussão é o resgate da memória de um povo. Ao resgatar a identidade das pessoas que viveram aqui antes de nós, nos reconhecemos em nossa própria identidade, e nos construímos um pouco mais enquanto brasileiros".

 

Em julho de 2001, a Cesp assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público Federal, comprometendo-se a monitorar os sítios arqueológicos existentes à margem direita do lago da usina Porto Primavera, pelo prazo de dois anos. A Cesp, no entanto, não cumpriu a obrigação, tendo sido necessária execução judicial. O início efetivo dos trabalhos foi em janeiro de 2004, encerrando-se em dezembro de 2005.

 

No decorrer do trabalho constatou-se que os estudos abrangidos pelo TAC não seriam suficientes para a completa proteção do patrimônio arqueológico da região, já que foram encontrados indícios de sítios arqueológicos na área das três usinas operadas pela Cesp.

 

O MPF, então, expediu Recomendação em julho de 2005, para que a empresa prorrogasse o prazo de monitoramento dos sítios arqueológicos por pelo menos mais dois anos e estendesse os estudos para os reservatórios de Jupiá e Ilha Solteira. A Recomendação não foi acatada, o que levou ao ajuizamento da ação na Justiça Federal.

 

Decisão liminar proferida pela Justiça Federal em abril de 2006 determinou a retomada dos estudos mas a Cesp só cumpriu a decisão a partir de setembro de 2007. Em decisão unilateral, a empresa estipulou que os trabalhos teriam duração de dois anos, o que efetivamente ocorreu. Desde outubro de 2009, os sítios arqueológicos de Três Lagoas estão sem qualquer monitoramento ou resgate, entregues à ação destrutiva da erosão.

 

Pesquisa arqueológica

 

Trabalho coordenado pelos pesquisadores Emília Kashimoto e Gilson Martins, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), levantou a existência de 333 sítios arqueológicos na região, sendo que pelo menos 169 estão na margem direita do Rio Paraná, em Mato Grosso do Sul. Foram coletadas 80 mil amostras de valor histórico, entre pontas de lança, fragmentos de cerâmica e até urnas funerárias. Uma delas foi encontrada com objetos comuns a sepultamentos e um crânio.

 

A datação do material revelou que a região era habitada há pelo menos sete mil anos por povos que viviam da caça, coleta e pesca. Parte significativa do material foi produzida pelos agricultores ceramistas da etnia guarani, a partir do século XVI. Todas as peças estão no Museu de Arqueologia da UFMS, em Campo Grande.

 

Usinas

 

As usinas de Jupiá e Ilha Solteira foram construídas antes da exigência de estudo de impacto ambiental (1988) e, portanto, sem a preocupação de preservação do meio ambiente e do patrimônio cultural. Para o MPF, extensa e significativa área arqueológica foi inundada e continua a ser destruída, na faixa de depleção (variação do nível do reservatório), daí o caráter emergencial das pesquisas arqueológicas.

 

Gilson Martins, da UFMS, afirma que "a região impactada pelas três usinas, além de muito extensa, abrange a área de um dos rios mais importantes para a geografia do continente sul-americano. Esta região é de relevância singular na arqueologia e na história do povoamento e dos movimentos migratórios do continente. Provavelmente, centenas de milhares de pessoas têm nas margens do Rio Paraná suas raízes, sua história e seu passado. Enquanto não houver preservação e monitoramento, o material arqueológico que conta toda essa história continuará sendo afetado."

 

A UHE Engenheiro Souza Dias (Jupiá) foi concluída em 1974. Está localizada no Rio Paraná, entre Andradina e Castilho (SP) e Três Lagoas (MS). Ela tem potência instalada de 1.551,2 MW. Sua barragem tem 5.495 metros de comprimento e o reservatório, 330 km2.

 

A Usina Hidrelétrica (UHE) Ilha Solteira é a terceira maior do país. Ela fica no Rio Paraná, entre Ilha Solteira (SP) e Selvíria (MS) e foi concluída em 1978. A potência instalada é de 3.444,0 MW, a barragem tem 5.605 metros de comprimento e o reservatório, 1.195 km2 de extensão.

 

Juntas, Ilha Solteira e Jupiá, compõe o sexto maior complexo hidrelétrico do mundo.

 

A UHE Engenheiro Sérgio Motta, também conhecida como Porto Primavera, fica no Rio Paraná, 28 km antes da confluência com o Rio Paranapanema. Sua barragem é a mais extensa do país, com 10.186,20 metros de comprimento, e o reservatório tem 2.250 km2.

 

Referência processual: 0000789-37.2005.403.6003

 

Assessoria de Comunicação Social

Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul

(67) 3312 7265/ 3312 7283 / 9297 1903

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Fonte: Assessoria de Comunicação Social do Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul
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