“Vocês arrancam a carne do meu povo” (Miq 3.2)
Nota do III Congresso da CPT sobre a situação do povo Guarani Kaiowa do Mato Grosso do Sul
Os mais de 800 participantes do III Congresso Nacional da CPT ouviram, com o coração apertado, os clamores dos povos indígenas. O povo Potiguara, da Paraíba, luta por preservar seu território e sofre pressão por parte das usinas de cana e de outros empreendimentos. Os índios Borari, do Pará, lutam por ver reconhecido seu território, invadido por madeireiras. Mas o que dói mesmo é ver a situação dos índios Guarani Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, conforme nos relataram os indígenas Heliodoro e Dominga. Queremos unir nosso grito ao seu grito de indignação e de protesto.
A realidade das comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul é das mais cruéis e violentas de nosso pais e merece a mais forte repulsa. Foram espoliadas de suas terras e hoje vivem espremidas em minúsculas aldeias que não lhes possibilita as mais elementares condições de sobrevivência, quando não são empurradas para acampamentos às beiras das estradas, sempre perto de uma terra tradicional, sujeitas às intempéries, à fome, à sede. Por falta de terra muitos são obrigados a trabalhar nas usinas de cana devendo aceitar as condições que lhes são impostas. Um povo auto-suficiente, de uma riqueza cultural impar, é tratado como marginal, como escória da sociedade, mal visto pelo conjunto da sociedade sul-matogrossense. Uma realidade que clama aos céus.
Sua luta pelo reconhecimento dos territórios ancestrais (tekoha) recebe as mais diferentes promessas de apoio de autoridades, mas nunca se concretizam. Sempre esbarram no poder político do estado e da maior parte dos municípios onde vivem que os consideram um entrave para o progresso. E quando há alguma sinalização positiva de uma possível solução, esta esbarra no poder judiciário que trava todo e qualquer encaminhamento. Isto se dá até no âmbito do Supremo Tribunal Federal. O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, deu um triste presente de Natal aos indígenas do Mato Grosso do Sul. No dia 24 de dezembro do ano passado suspendeu os efeitos do decreto presidencial, publicado dois dias antes, que homologou a demarcação da Terra Indígena Arroio-Korá. Suspendeu ainda os efeitos de outros decretos presidenciais de demarcação de outras áreas indígenas.
Também não se sente um forte empenho da FUNAI na solução dos problemas indígenas do estado.
Numa situação destas, mais do que qualquer outra palavra se aplicam as palavras do profeta Miquéias:
“Escutem, líderes e autoridades do povo! Vocês que deviam praticar a justiça e, no entanto, odeiam o bem e amam o mal. Vocês tiram a pele do meu povo e arrancam a carne dos seus ossos. Vocês devoram o meu povo: arrancam a pele, quebram os ossos e cortam a carne em pedaços, como se faz com a carne que vai ser cozinhada” (Miq 3,1-3).
Os participantes do III Congresso da CPT exigem que os direitos dos povos indígenas sejam respeitados, que sua cultura seja valorizada, que sua vida seja protegida. É urgente uma solução justa para os todos os povos indígenas do Brasil em especial para o Guarani Kaiowa do Mato Grosso do Sul.
Montes Claros, 21 de maio de 2010
Os participantes do III Congresso Nacional da CPT