23/07/2009

Informe nº. 873: Lula diz que não vai impor “goela abaixo” hidrelétrica de Belo Monte (PA)

Informe nº. 873

 

  • Lula diz que não vai impor “goela abaixo” hidrelétrica de Belo Monte (PA)
  • Boff: as CEB’s devem se chamar comunidades ecológicas de base

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Lula diz que não vai impor “goela abaixo” hidrelétrica de Belo Monte (PA)

 

Ontem, 22 de julho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o governo não irá impor “goela abaixo” a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, Pará. Índios, ribeirinhos e outros especialistas no assunto expuseram ao presidente os graves impactos sócioambientas que a construção de Belo Monte pode gerar e também apontaram a inviabilidade técnica da obra.

 

O presidente Lula reuniu na mesma ocasião os integrantes do governo responsáveis pela hidrelétrica de Belo Monte, como o presidente em exercício da Eletrobrás, Valter Cardeal; o presidente da Eletronorte,  e uma comitiva que questiona a construção da barragem. Além dos representantes de comunidades ameaçadas pela obra participaram do encontro o bispo da Prelazia do Xingu e presidente do Cimi, Dom Erwin Kräutler; o professor do Instituto de Energia e Eletrotécnica da USP, Célio Bermann; e os Procuradores da República, do Ministério Público Federal – Pará, Felício Pontes e Rodrigo Costa e Silva.

 

O professor Bermann explicou ao presidente que a hidrelétrica de Belo Monte, cujo custo deve ultrapassar os 20 bilhões de reais, deve gerar uma média de apenas 4 mil KW de potência no ano e não cerca de 11 mil KW, como afirmam os interessados no empreendimento. Além disso, durante três meses por ano (no período da vazante), a energia gerada pode não chegar a 2 mil Kw. Os representantes da Eletrobrás e da Eletronorte presentes não contestaram a informação. Segundo Bermann, o presidente ficou impressionado com esses dados e pediu estudos mais aprofundados sobre o empreendimento.

 

“Acho que o presidente ficou sensibilizado com os dados técnicos apresentados e com os relatos sobre os impactos da obra para as comunidades ribeirinhas e indígenas”, avaliou Dom Erwin. Para o bispo, a reunião foi positiva. “Pela primeira vez nos conseguimos colocar nossa angústia e indignação para o presidente. Também ficou claro para os responsáveis pela área de energia que nós nos preparamos muito bem, que entendemos do assunto”, completou Dom Erwin.

 

Segundo Dom Erwin, o presidente afirmou que acontecerão outras reuniões sobre o tema. Lula também lembrou que o país tem uma dívida com os atingidos pelas barragens já construídas.

 

José Carlos, do povo Arara, também saiu otimista da reunião. “Tivemos um avanço na questão de Belo Monte, pois o presidente se comprometeu a não enfiar a obra goela abaixo. Isso foi bom, pois na região, os que querem a barragem dizem que Belo Monte sai de qualquer jeito”, comentou. José Carlos acredita que, a partir de agora, os impactos apontados pelas comunidades serão melhor analisados. “Só consideram como impacto direto as terras que serão alagadas. Na terra do meu povo, o rio vai secar e dizem que isso é impacto indireto”, contesta.

 

Licenciamento ambiental suspenso

A falta de dados sobre os impactos da hidrelétrica de Belo Monte nas terras indígenas da região do Xingu foi uma das falhas apontadas por técnicos do Ibama no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da obra. Apesar disso, o EIA foi aceito pelo Ibama. Em função disso, o Ministério Público Federal do Pará ajuizou uma ação contestando essa decisão e processando por improbidade administrativa o funcionário que aceitou o EIA. No início de junho, a justiça concedeu decisão liminar favorável à ação do MPF-PA e, desde então, o licenciamento está suspenso.

 

No encontro com Lula, os representantes das comunidades do Xingu entregaram uma carta que explica os principais problemas (legais, técnicos, ambientais, sociais, econômicos…) do projeto da hidrelétrica de Belo Monte.

 

 

Boff: as CEB’s devem se chamar comunidades ecológicas de base

 

As Comunidades Eclesiais de Base (CEB´s) devem lutar não mais por um novo mundo possível, mas por um novo mundo necessário. A afirmação é do teólogo Leonardo Boff, durante debate no 12º Intereclesial, que reúne mais de cinco mil pessoas entre 21 e 25 de julho, em Porto Velho, Rondônia. Cerca de 40 povos indígenas participam do encontro, cujo tema é “Do ventre da terra, o grito que vem da Amazônia”.

 

Segundo Boff, tema do encontro é bastante atual e representa o clamor da amazônia e de todo o planeta. A escolha da ecologia como o tema significa um alargamento da consciência das pessoas. "A escolha da Amazônia como local do encontro trouxe a realidade das devastações aqui existentes, das grandes hidrelétricas, da morte de povos originários. Tudo isso leva as pessoas a pensarem e buscarem soluções. Essa é a importância dessas comunidades: começar lá embaixo, aos poucos, na base da sociedade para que a haja transformação."

 

Boff ressaltou também o papel das comunidades indígenas para um mundo sustentável. "Os analistas que estudam mais em detalhe a lógica da natureza são unânimes em dizer que nós só salvamos o planeta, a Amazônia, o Cerrado, se conseguirmos salvar esses povos originários". Ele afirma que são essas populações que sabem lidar com a terra da forma correta. "Eles são ecologicamente naturais e sabem, de forma espontânea, como viver com a natureza", completa.

 

O teólogo reforçou que deve-se buscar uma nova sociedade, com um sistema diferente e que as comunidades de base têm papel importante para uma visão ecológica. "As comunidades eclesiais de base devem ser comunidades ecológicas de base, dando o exemplo e construindo o novo mundo necessário, porque o mundo como está hoje não agüenta, está se esgotando. Se ainda quisermos que nossos filhos vivam nesse nosso planeta, precisamos mudar e seguir os exemplos dos povos originários".

 

CEB´s: um jeito normal de ser Igreja

Na abertura do encontro, o Arcebispo de Porto Velho Dom Moacyr Grechi; a líder indígena e educadora Eva Canoé e o teólogo e assessor nacional das CEBs Padre Benedito Ferraro falaram sobre o trabalho das CEBs. Para Ferraro, o grande papel das CEBs nesses mais de 40 anos de existência é a busca pela libertação. “A comunidades eclesiais de base não devem mais ser consideradas ‘Um novo jeito de ser Igreja’, mas o jeito normal de ser Igreja, com forte compromisso social na busca pela libertação em todos os sentidos: econômico, ecológico, cultural, ecológico, sexual, entre outros pontos”.

 

Dom Moacyr enfatizou a alegria de receber o encontro das CEBs na cidade de Porto Velho e destacou as lutas das comunidades. Ele citou o provérbio africano “gente simples, fazendo coisas pequenas em lugares sem importância, conseguem mudanças extraordinárias”, que segundo ele, é o retrato das CEBs hoje.

 

Para Eva Canoé, as CEBs respeitam a cultura e a religião dos povos indígenas, em suas crenças e seus rituais. Além disso, afirmou que “a igreja organizada em comunidades de base se importa com a autonomia dos povos indígenas, apóia suas lutas e se importa com sua causa, seus direitos e necessidades”. 

 

Brasília, 23 de julho de 2008

Conselho Indigenista Missionário

Fonte: Cimi
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