26/04/2005

Uma aldeia amanhece na Esplanada dos Ministérios

Esse dia 25 de abril amanheceu com uma cena inédita. Em frente ao Congresso Nacional amanheceu uma aldeia plural, nos seus contornos, jeitos, arquitetura e com matéria-prima alternativa, conforme um dos apoiadores. Taquaras com palhas de palmeira deram o tom das 25 casas construídas, de diversos tamanhos e formas, compondo um belíssimo cenário arquitetônico e emblemático, onde a inspiração de Niemayer contrasta com a arquitetura singela dos habitantes primeiros de todas as regiões do país. Com uma diferença: as obras de Niemayer levaram meses ou até anos para saírem da criação para o papel e deste para a realidade concreta. As casas indígenas levaram em média menos de duas horas para brotarem do chão gramado da Esplanada dos Ministérios.


 


“Um cenário dantes nunca visto aqui em frente ao Congresso”, exclamam alguns, eufóricos com a obra da madrugada. De fato. Apesar do Acampamento Terra Livre já ter acontecido no ano passado, e mesmo antes dele já ter havido ali um acampamento dos índios do sul, nenhum dos precedentes se iguala ao atual em número de participantes, mais de 600, de quase 100 povos, e nem em sua disposição. Num espaço de uns cinco mil metros quadrados estão dispostas em forma de U as 25 casas, devendo surgir várias ainda no decorrer do dia, com um grande pátio no centro, onde está montado um circo, para atividades culturais e debates. De fato a Esplanada dos Ministérios amanheceu indígena no centro do poder. É realmente uma lição de cidadania e luta que estará acontecendo durante toda essa semana, como encerramento do Brasil Indígena. Foi dada a largada de várias mobilizações que irão acontecer no decorrer deste ano ainda.


 


“Tudo está dando certo”, declarou alguém eufórico. Desde que a idéia foi lançada durante o Fórum Social Mundial em Porto Alegre, em janeiro deste ano, constitui-se uma grande unidade no movimento indígena e indigenista em torno da plataforma de mobilização e das principais bandeiras, dentre as quais novamente se destaca a luta pela terra e a definição da política indigenista do governo, com a participação efetiva dos povos indígenas e de organismos da sociedade civil. Já tem sido revelada a face cruel do descaso com que tem sido tratada a questão indígena, refletida nos inúmeros assassinatos, violências de toda ordem, morte de crianças, especialmente Kaiowá-Guarani, por desnutrição e fome…


 


Tudo indica que este será um grande momento de visibilização e avanço das lutas e reivindicações do movimento indígena no Brasil.


 


Um lindo espetáculo ao amanhecer. As malocas ainda em construção começam a se agitar com danças rituais, enquanto os últimos detalhes e palhas vão sendo colocadas sobre as múltiplas casas. Enquanto isso vão surgindo as pinturas corporais, os adornos juntamente com uma enorme vontade e decisão de fazer valer seus direitos discutidos e gritados bem alto no espaço central dos poderes. Comovente ver o sol lançar seus primeiros raios sobre a nova aldeia, fazendo despertar da profundeza da terra, todo o amor que seus filhos primeiros tem por ela, ao mesmo tempo em que a vêem sendo roubada, destruída, mal tratada. Eles estão dispostos a começar a virar esse jogo. A aldeia será esse espaço de luta.


 


Que Tupã e os deuses de todos os povos aí reunidos ajudem para que novos tempos surjam para os povos indígenas e todos os excluídos e oprimidos deste país.


 


Acampamento Indígena Terra Livre – Brasília, 25 de abril de 2005.


 


Egon Heck


Cimi Regional Mato Grosso do Sul


 

Fonte: Cimi
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