27/09/2019

Comunicado do povo Munduruku: “Somos contra o garimpo e mineração em terra indígena”

Durante audiência pública para legalizar garimpos, na manhã desta sexta (27), em Itaituba (PA), povo Munduruku protesta

Mulheres Munduruku presentes na luta contra a legalização da mineração e garimpos em terras indígenas. Crédito da foto: Arquivo Munduruku

O movimento Munduruku Ipereg Ayu realiza na manhã desta sexta-feira (27) um protesto em Itaituba (PA) contra a mineração em terras indígenas durante a audiência pública “Mineração: Economia, Meio Ambiente e Sociedade”, convocado pela Subcomissão Permanente de Mineração, da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. 

Durante entrevista coletiva, na quarta (25), o prefeito de Itaituba Valmir Clímaco, ao lado de garimpeiros e demais políticos da cidade, declarou que a intenção dos parlamentares com a audiência é legalizar a atividade garimpeira no Tapajós. Organizações, associações e o movimento Ipereg Ayu são contra. 

Antes da abertura do evento, marcado para às 9 horas, cerca de 100 Munduruku protestaram e leram aos parlamentares, políticos da região e demais presentes um comunicado dos Munduruku contra a legalização da mineração e exigindo consulta prévia ao povo. 

Leia na íntegra:  

 

Liderança Munduruku lê o comunicado abaixo para políticos e autoridades públicas presentes na audiência pública. Crédito da foto: Arquivo Munduruku

COMUNICADO DO POVO MUNDURUKU

Mundurukânia, 27 de setembro de 2019

O desgoverno do Brasil não fala pelo povo Munduruku.

Bolsonaro, em sua fala na ONU, disse que nós indígenas somos “homens da caverna”. Ele nos define pelo que ele é. Bolsonaro não nos representa e as suas palavras são vazias. Nossas crianças tem mais sabedoria que ele.

Reunimos caciques, cacicas, guerreiras, guerreiros, pajés, cantores e professores do nosso povo Munduruku do médio e alto Tapajós e baixo Teles-Pires. Conversamos sobre todos os ataques e ameaças aos povos indígenas no Brasil e nossos territórios e direitos.

Trazemos a nossa palavra.

Sabemos que os “daydu” – nome que damos a políticos traidores – estão fazendo leis para acabar com a demarcação de terras indígenas. Querem liberar nossas terras para exploração de minérios, construção de hidrelétricas, ferrogrão, hidrovia.

Querem acabar com os povos indígenas, destruindo nossas florestas, rios e locais sagrados. Somos contra o garimpo e mineração em terra indígena. O garimpo está dividindo nosso povo, trazendo novas doenças, contaminando nosso povo com mercúrio, trazendo drogas, bebidas, armas e prostituição. E ganância.

Tudo isso impacta todos os povos indígenas, comunidades tradicionais como Montanha e Mangabal e principalmente nosso povo Munduruku que vivem e protegem há centenas de anos os rios e as florestas do Tapajós. Não existe diálogo para destruição. Nós não negociaremos nossas terras e vamos impedir qualquer organização que servem a isso de entrar no Tapajós.

Alguns parentes cegos com o brilho do ouro, estão fazendo o jogo sujo dos daydu, e publicamente afirmando que o povo Munduruku é a favor de garimpo e da mineração. Vamos repetir: suas palavras estão cheias de “dapxim” – cheias de ódio e mentira.

Esses Munduruku sentados nessas mesas de Brasília com vocês estão doentes. Eles deixaram máquinas de garimpo destruírem nossa terra, e não nos representam, e nem são a maioria.

Nenhum vereador representa o povo Munduruku, porque ele não faz parte da nossa política e organização tradicional. Não podem falar de nenhum lugar sagrado, não podem negociar em nome do povo Munduruku.

Somos mais de 14 mil e temos o nosso movimento de resistência e nossas associações. Temos um protocolo de consulta que deve ser respeitado por vocês como lei, com direito de veto.

Nenhuma lei pode dizer como será feita a consulta a cada povo. A convenção 169 já existe para dizer o que é consulta livre, prévia e informada e nosso protocolo existe para dizer como ela deve ser feita. Não estamos sendo consultados sobre nenhuma dessas leis e projetos que vocês estão pensando para o Tapajós, que é a nossa casa.

Temos autonomia para ter nossa organização e decidir sobre nosso futuro, como vocês escreveram na Constituição Federal de 1988 e na Convenção 169 da OIT.

Estamos construindo nosso bem viver com a sabedoria das mulheres, geradoras da vida, dos nossos pajés, guias espirituais, dos nossos guerreiros, das nossas lideranças e também das nossas crianças, e estamos prontos para rasgar todas essas leis e projetos que espalham a morte.

Queremos alertar vocês que somos um povo guerreiro. Aprendemos a guerrear com o grande Karodaybi, nos silêncios das madrugadas, e por isso, somos chamados por outros povos de formigas de fogo.

Estamos prontos para guerra que vocês estão travando e queremos avisar que aqui no nosso território na Mundurukânia, ocupada há séculos pelos nossos antepassados, onde por toda parte do Tapajós encontramos pegadas e sinais de Karosakaybu e Muraycoko, ninguém vai entrar para explorar, destruir e transformar tudo em mercadoria e dinheiro. Já passou da hora do Governo cumprir as leis que vocês mesmos escreveram e retirar os invasores das nossas terras. Denunciamos há mais de 20 anos os madeireiros e garimpeiros pariwat e sempre temos que agir sozinhos.

Mas não vamos parar e não vamos nos render. Nunca perdemos uma guerra e já cortamos algumas cabeças de inimigos. Será que teremos que voltar a cortar as cabeças dos inimigos? Sabemos como agir, a partir da nossa política e organização tradicional.

Movimento Munduruku Ipereg Ayu

Associação das Mulheres Munduruku Wakoborun

Associação Indígena Pariri (Médio Tapajós)

Associação Dace (Teles-Pires)

Associação Wuyxaximã

Associação Indígena Pusuru

Associação Kurupsare

CIMAT

Sawe

 

Fonte: Movimento Munduruku Ipereg Ayu
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