
As crianças Kaiowá e Guarani inundam aldeias e retomadas: sinais de esperança em meio ao horror a que são submetidas pela violência latifundiária. Foto: Ir. Carine Fontes Ribeiro/Cimi
Neste Dia das Crianças, comemorado no dia 12 de outubro, o Brasil celebra e reza à sua Mãe Aparecida — mulher negra, encontrada nas águas, símbolo de fé e resistência de um povo que não desiste. Mas, enquanto flores e brinquedos enfeitam vitrines, em Guyraroká, no coração do Mato Grosso do Sul, crianças Guarani e Kaiowá assistem à violência contra a vida.
Na recente retomada de parte de suas terras, cachorros foram enterrados vivos diante dos olhos infantis [1]. Barracos destruídos, panelas soterradas, silêncio imposto. A cena fere a alma, não só da comunidade, mas de toda a criação. Essa brutalidade não é apenas física — é simbólica. É o gesto de uma sociedade que perdeu o sentido do sagrado, que ensina às crianças o medo, a impotência e o horror, quando deveria mostrar-lhes a ternura e a justiça.
Para os povos indígenas, a vida é uma só — humana, animal, vegetal e espiritual. Enterrar um cachorro vivo é ferir o próprio equilíbrio do mundo. É romper o fio invisível que liga a natureza ao coração do Criador. As crianças, que aprendem com os anciãos a respeitar cada ser da floresta, crescem agora vendo a violência dos que não reconhecem a Mãe Terra como sagrada.
Pois, enquanto houver uma criança indígena em Guyraroká, a esperança não será soterrada. Ela florescerá, azul como o manto de Maria, viva como a própria Terra
Mas Aparecida, Mãe Negra do Brasil, também é Mãe das crianças indígenas, das que choram e das que resistem. Sob seu manto azul cabem todos os pequenos: os que brincam nas cidades e os que, em Guyraroká, testemunham o sofrimento e aprendem, cedo demais, o que é a injustiça.
As crianças Guarani e Kaiowá são sementes de esperança. Carregam nos olhos o brilho dos rios e nas mãos a força de seus ancestrais. São elas que guardam a memória da terra e anunciam que a vida não pode ser enterrada — porque brota, insiste e renasce.
Neste dia das crianças, sob o olhar de Nossa Senhora Aparecida, que o Brasil escute o grito que vem da terra, dos animais e dos pequenos. Que desperte de sua indiferença e transforme compaixão em justiça, fé em compromisso, devoção em cuidado.
Pois, enquanto houver uma criança indígena em Guyraroká, a esperança não será soterrada. Ela florescerá, azul como o manto de Maria, viva como a própria Terra.

Manifestação Guarani e Kaiowá em Brasília (DF) – 08/08/2024. Foto: Tiago Miotto/ Cimi
Súplica à mãe Aparecida
Mãe, sob teu manto azul descansam os olhos das crianças, pequenos que viram a vida ser ferida diante de si, mas que ainda carregam a coragem e a esperança de um povo inteiro.
Mãe de Aparecida, cujo olhar se volta para os pobres e marginalizados, acolhe também os cães e todos os animais da aldeia, irmãos na criação, silenciados pela violência, símbolos da ternura que habita a terra.
Ensina-nos a cuidar da vida com o mesmo respeito com que os povos indígenas cuidam da natureza, onde cada ser é sagrado e cada sopro é dom
Cobre com teu manto as crianças aterrorizadas, os anciãos que rezam em silêncio, as mulheres que refazem o lar sobre o barro da dor. Que teu amor cure o medo e transforme o pranto em coragem.
Ensina-nos a cuidar da vida com o mesmo respeito com que os povos indígenas cuidam da natureza, onde cada ser é sagrado e cada sopro é dom.
Que tua presença desperte a humanidade adormecida, para que ninguém mais enterre a inocência, nem a vida que brota da terra.
Sob teu manto, Mãe da Esperança, renasça a justiça, floresça a paz, e brilhe teu rosto Divino nas crianças da terra ferida.
Amém.