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“Não cabe conciliação quanto a direitos fundamentais”, diz Cimi ao STF sobre marco temporal em semana violenta

Povos indígenas marcham em direção ao STF, no dia 30 de agosto de 2023, para acompanhar votação sobre marco temporal. Foto: Hellen Loures/Cimi

Povos indígenas marcham em direção ao STF, no dia 30 de agosto de 2023, para acompanhar votação sobre marco temporal. Foto: Hellen Loures/Cimi

Por Assessoria de Comunicação – Cimi

Em nota técnica juntada aos processos que tratam da Lei 14.701/2023, envolvidos em procedimento de conciliação sobre demarcação de terras indígenas, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirma ao Supremo Tribunal Federal (STF) que “não cabe conciliação sobre o marco temporal” por se tratar de direitos indisponíveis e fundamentais.

No próximo dia 5 de agosto, os trabalhos da comissão de conciliação no STF terão início para tratar da controvérsia entre as ações ingressadas na Corte requerendo a inconstitucionalidade e a constitucionalidade da lei (leia mais abaixo). Em abril, o ministro Gilmar Mendes negou pedido para suspendê-la e determinou que a questão deve ser discutida previamente durante as audiências de conciliação. As reuniões estão previstas para seguir até 18 de dezembro deste ano.

O Cimi argumenta que o tema foi pacificado pela Corte Suprema quando em 27 de setembro de 2023, por nove votos a dois, os ministros decidiram em Plenário fixar como tese de repercussão geral no Recurso Extraordinário (RE) 1017365 a rejeição à possibilidade de adotar a data da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988) como marco temporal para definir a ocupação tradicional da terra pelas comunidades indígenas.

Também na nota técnica, o Cimi expõe que as consequências da Lei 14701/23 têm motivado uma onda de invasões e violências perpetradas contra os povos indígenas em territórios demarcados, mas, sobretudo, naqueles que estão com o procedimento paralisado em alguma de suas fases – o que é o caso dos povos e territórios que nos últimos dias sofreram com ataques de homens armados, encapuzados e empresas de segurança.

Apenas nesta última semana ocorreram oito ataques contra retomadas e aldeias de sábado (14) até esta quinta-feira (18) [1]. Entre sábado e segunda, foram seis e atingiram os povos Guarani Mbya e Kaingang, no Rio Grande do Sul, Avá-Guarani, no Paraná, e Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. Indígenas foram baleados e feridos. Na madrugada desta quinta, a retomada Parnamirim do povo Anacé, no Ceará, foi atacada a tiros [2] e acabou completamente destruída. Já os Parakanã, da Terra Indígena Apyterewa, no Pará, relataram nesta quinta um ataque sofrido pelo povo [3].

Diante de tal realidade exposta pelos povos indígenas e seus aliados no 56º Período Ordinário de Sessões do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, entre junho e este mês, o Relator Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os direitos dos Povos Indígenas, José Francisco Calí Tzay, pediu ao STF, no último dia 11, que suspenda a aplicação da lei, além de paralisar outras iniciativas que tenham a tese como orientação [4].

Leia a nota técnica na íntegra aqui [5].

Da decisão do STF à Lei 14701/23

Ato contínuo à decisão do STF invalidando a tese do marco temporal, em setembro do ano passado, parlamentares no Congresso Nacional, liderados pela bancada ruralista, defenderam que a Suprema Corte estava usurpando poderes legislativos e aceleraram a tramitação do Projeto de Lei (PL) – votado em tempo recorde, sem consulta aos povos indígenas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou alguns pontos do PL, levando em consideração a decisão do STF, mas todos os vetos foram derrubados no Congresso. Em dezembro a Lei 14701 acabou promulgada e entrou em vigor. (mantiveram dois vetos: povos isolados e perda da característica indígena. Veja como organizar a frase: poderia ser: mas quase a totalidade dos vetos foi derrubada)

Partidos políticos, como o PSOL e a Rede, além da Apib, ingressaram no STF com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei 14701. Por sua vez, os partidos PL, PP e Republicanos impetraram uma Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) para manter a lei. Tem outras duas ações, uma do PT, PCdoB e PV e outra do PDT..

O ministro Gilmar Mendes foi sorteado como relator das ações e ao negar pedido para suspender a deliberação do Congresso que validou o marco temporal, determinou no último dia 22 de abril a instauração de processo de conciliação envolvendo as ações sobre o marco temporal para a demarcação de terras indígenas.

A comissão terá seis representantes indicados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), quatro indicados pelo governo federal, além da Funai, a Câmara Federal e o Senado Federal terão três membros cada, os estados um e os municípios também um.