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Decisão do TRF-5 retoma desintrusão da TI Pankararu e indígenas sofrem retaliação em rodovia

A quarta turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região decidiu, por unanimidade, na tarde desta terça-feira, 19, pela continuidade da desintrusão da Terra Indígena Pankararu, localizada entre os municípios de Tacaratu, Jatobá e Petrolândia, no sertão de Pernambuco. O veredito ocorreu durante o julgamento do mérito de um agravo de instrumento, demandado pelos posseiros, que paralisou a retirada pacífica dos ocupantes não-indígenas na primeira quinzena de maio.

Na prática, volta a valer o que havia decidido o juiz federal Luiz Felipe Mota Pimentel de Oliveira, da 38ª Vara Federal de Serra Talhada. Desta forma, a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Polícia Federal devem, nas próximas semanas, após serem comunicadas oficialmente da determinação do TRF-5, retomar as notificações às famílias presentes na Terra Indígena dando-lhes dez dias para a saída ao assentamento reservado pelo Incra, além do saque das indenizações reservadas pela Funai.

“Queremos nosso território livre para exercer com liberdade o nosso direito territorial”, diz Sarapó Pankararu

A reação foi imediata. No retorno à Terra Indígena, os 60 Pankararu, que saíram da capital Recife logo após a decisão do TRF-5, foram abordados na estrada, enquanto passavam pelo município de Delmiro Gouveia (AL), por duas vans com indivíduos identificados pelos indígenas. Os veículos deram “fechadas” no ônibus e carros que levavam os Pankararu. “Ligamos para o Batalhão da Polícia Militar de Petrolândia. Quando chegamos no município de Jatobá, na altura do trevo, a PM nos escoltou até a aldeia”, conta Sarapó Pankararu.

Para o indígena, a liminar que suspendeu a desintrusão gerou expectativas e esperanças entre os posseiros. Com a decisão pela continuidade da retirada, a frustração gerada entre os posseiros acabou sendo proporcional. “Aumenta a tensão dentro do nosso território em um contexto já acalorado. A liminar foi um retrocesso. O que as pessoas que impedem a desintrusão querem é criar embaraço jurídico, enrolar o máximo possível. O que é ruim para os dois lados da história. Esperamos agora que a Polícia Federal venha executar o trabalho. Tudo pacífico como desejamos. A Funai, que está com escritório montado em Itaparica, acompanhando”, diz.

Sarapó afirma que “o povo já esperava essa resposta, essa vitória. Não acreditávamos que fosse outro o desfecho. Ficamos triste quando houve a suspensão, mas o pronunciamento dele (desembargador) foi muito bom: fez todo o histórico da questão territorial e disse que não cabia (o agravo) porque tudo o que os posseiros alegaram, não procedia. A Funai, o Incra e a União fizeram a parte deles”.

Conforme análise da Assessoria Jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ainda cabe recurso aos posseiros no próprio TRF-5 e instâncias superiores. “Porém, no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF) a discussão de ação ordinária fica mais estreita, pois não se pode rediscutir provas e fatos. De qualquer forma, a decisão de hoje se constitui numa importante vitória para o povo Pankararu”, explica o assessor jurídico do Cimi, Adelar Cupsinski.

Sarapó Pankararu, de camisa polo e cocar, discursa na frente do TRF-5 após decisão pela retomada da desintrusão. Foto: Ângelo Bueno/Cimi

Justiça e reparação

Há 25 anos os Pankararu aguardam pelo usufruto exclusivo da Terra Indígena demarcada em 1987. As décadas de espera levaram o povo para o Recife, nesta segunda-feira, 18. Na capital realizaram um protesto na Assembleia Legislativa, cobrando dos parlamentares posições equilibradas sobre o conflito fundiário [2]. Contaram com o apoio das comunidades de terreiro e demais movimentos sociais durante todo o dia. Na sequência iniciaram uma vigília no Recife Antigo, com apresentações de músicos e artistas sensíveis à causa indígena, que encerrou na manhã desta terça com um ritual no TRF-5. Os posseiros, por sua vez, não estão desamparados.

São 18.500 hectares para o reassentamento e R$ 6 milhões em indenizações para as 300 famílias posseiras

O Incra reservou 93 lotes para o Reassentamento Abreu e Lima, destinado a estas famílias posseiras. Conforme o órgão federal, os posseiros decidiram não se transferir para o local, inclusive atrasando o cadastro das famílias (só ocorreu por determinação judicial). No total, a área reservada possui 18.500 hectares – a TI Pankararu possui 8.100 – e fica no município de Tacaratu. Conforme o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal de Serra Talhada atestam, agora com a certeza do TRF-5, é de que em juízo, modalidade também em que correm os juros, estão depositados R$ 6 milhões para as indenizações.

De acordo com informações obtidas pela reportagem junto à Funai, aproximadamente dez famílias saíram por livre e espontânea vontade até a suspensão da desintrusão. Por outro lado, cerca de 190 famílias não indígenas (de um total de 300) já residem fora do território tradicional, mas mantêm propriedades nos 20% de área Pankararu que dizem ocupar há séculos. Conforme as lideranças Pankararu, é exatamente este espaço da Terra Indígena o mais produtivo, mas que vem sendo usado como sítio ou casa de campo para seus “proprietários”.